De um país quebrado a uma “maravilha”. Embora as falas do presidente Bolsonaro nesta última semana não tenham tido maior influência no mercado, acabam por reforçar um certo descrédito na capacidade de o governo redefinir rumos e estabelecer um programa capaz de induzir um crescimento mais robusto da economia, ao mesmo tempo em que consiga assegurar perspectivas mais favoráveis para as finanças públicas. Isso não significa, porém, que não possamos contar com um cenário melhor em 2021.
Vale lembrar que temos tido avanços importantes na agenda do Congresso, independentemente de um esforço maior do Executivo. Tem os novos marcos do saneamento, do gás, da cabotagem, Fundeb, lei de falências, de licitações, autonomia do Banco Central. Houve um trabalho eficiente na discussão de medidas e do orçamento de calamidade.
Há ainda uma tendência reformista, que pode produzir avanços importante neste ano, no que se refere, por exemplo, às Reformas Tributária e a Administrativa, enquanto o governo se omite ou marca presença de última hora, como aconteceu até com a definição do auxílio emergencial, para se apropriar dos resultados.
Temos uma situação fiscal difícil, com um imenso rombo a ser administrado, ameaças ao cumprimento do teto de gastos e um endividamento público que caminha para os 100% do PIB, num cenário em que a pandemia, numa segunda onda, pode impor mais despesas.
Aliás, entre as omissões do governo, sem dúvida, podemos incluir a demora na aquisição de insumos e vacinas, que amplia os prazos previstos para a imunização e deixa o País mais exposto aos efeitos da pandemia. Pandemia que o presidente diz ter sido potencializada pela mídia, ignorando a situação global de contágio, de novas medidas restritivas, da pressa dos países em avançar com a vacinação.
O que percebemos disso tudo é muita inércia em relação às iniciativas que poderiam deixar o País muito menos desconfortável dos pontos de vista sanitário e econômico. Mas até pelas cobranças e pela necessidade de um posicionamento político as coisas podem começar a avançar. Fica evidente a necessidade de uma mobilização maior em torno da vacinação contra a Covid 19.
Por outro lado, mesmo com a tentação de se prosseguir com estímulos e as divisões internas do próprio governo, tem prevalecido a percepção da importância de se preservar o teto de gastos, até para evitar maiores instabilidades do mercado, perda de credibilidade e de fluxo de investimentos, com dificuldades para a rolagem da dívida. Situação que pode frear iniciativas populistas.
De resto é esperar que o Congresso continue avançando com a pauta econômica. Não que entre os parlamentares não tenha uma boa parcela que jogue contra uma política econômica mais responsável. Mas as pautas com foco no fiscal estão colocadas, desde as relacionadas ao ajuste das finanças, até as reformas, passando por novas medidas sociais, que não comprometam o orçamento. Temas relevantes que podem caminhar, ainda que aos trancos e barrancos, diante da polarização presente no Legislativo, como fica evidente no embate entre a candidatura do governo e de uma frente de partidos, e se estende também a outros temas.
Cabe ressaltar ainda o papel do Banco Central que tem conseguido manter os juros no menor patamar já registrado, com a inflação nos parâmetros da meta, apesar de nem sempre conseguir frear as pressões cambiais mais fortes. Ainda em relação ao BC cabe ressaltar o sucesso do PIX.
É incrível como, em meio à enxurrada de narrativas, muitas vezes não percebemos todas as mudanças positivas que estão ocorrendo. Ou percebemos, mas ficamos mais focados nas dificuldades, que são muitas, mas não intransponíveis. Ainda podemos fazer de 2021 um ano muito melhor, com menos polêmica e mais trabalho.