A decisão da Ford de suspender a produção no Brasil, independentemente das condições globais da empresa, do posicionamento no mercado de automóveis, reforçou as discussões relacionadas aos desafios de se empreender no País, o Custo Brasil e a necessidade de avançar com reformas estruturais, além de assegurar um crescimento sustentável de longo prazo. Questões que são colocadas, paralelamente, à urgência em se estabelecer perspectivas mais favoráveis para a evolução das contas públicas – o que determinaria maior confiança quanto ao potencial de expansão sustentável do País – e maior segurança jurídica e institucional.
O Brasil impõe sérios entraves às empresas sem oferecer segurança quanto ao crescimento econômico e respeito às regras do jogo.
São dificuldades que podem impedir resultados melhores até para setores, como o automobilístico, que foi um dos que mais receberam incentivos nas últimas décadas.
Mesmo que a Ford tenha estratégias próprias para tomar essa decisão, chamou muita atenção, em particular, o fato de estar mantendo e até ampliando investimentos na Argentina, país que enfrenta uma seríssima crise econômica, com incertezas maiores que o Brasil. O custo de produção lá é menor. O que pode ser uma vantagem enorme quando se tenta aumentar o retorno financeiro.
A nossa lista de problemas é enorme. Temos deficiência até em relação à educação e qualificação da mão de obra. Depois tem o custo de contratação. A logística fica mais cara e complicada pelo atraso na infraestrutura. A carga tributária e a complexidade do sistema ajudam a tornar o produto brasileiro mais caro e menos competitivo. Decisões judiciais, alterando regras contratuais, aumentam muito as incertezas, além do próprio posicionamento do governo em relação à determinados temas.
Temos avanços até importantes, em andamento, na questão da regulamentação e melhoria do ambiente de negócios, como a Lei de Liberdade Econômica, de Falências, do gás, março do saneamento. Mas não se vê o governo com disposição na defesa de uma reforma tributária mais ampla, de uma reforma administrativa que produza resultados mais rápidos, em avançar com privatizações e mesmo promover o ajuste esperado das finanças.
Várias vezes já citei a falta de coordenação interna do governo para levar adiante as pautas urgentes referentes ao ajuste das finanças públicas. Ainda estamos no aguardo da aprovação do orçamento deste ano, se possível, junto com a PEC emergencial e a revisão de benefícios e subsídios, que permitam o cumprimento do teto dos gastos, com alguma margem para que se possa cuidar da assistência social frente à pandemia, fora os necessários estímulos ao crescimento.
Não se pode esquecer ainda a posição particular do presidente Bolsonaro em questões como a revisão de benefícios sociais, até para que se pudesse criar um novo programa como o Renda Brasil, a privatização do Ceagesp, que já se colocou totalmente contra, e as medidas propostas para o Banco do Brasil, com fechamento de agências e redução do pessoal. O momento pode até não ser o mais adequado para demissões, pela crise ainda decorrente da pandemia. Mas são atitudes que reforçam as dúvidas quanto ao que se pode esperar de reformulação da economia. Por mais que haja uma defesa pública da diminuição do tamanho do Estado, ajuste das finanças públicas e implementação das Reformas, na prática, o que se vê é muito mais discurso do que iniciativas concretas. E as promessas eram ambiciosas…
Pode haver até resistência do Congresso em relação a essas promessas. E tem muito lobby contrário. Mas cabe ao governo lutar para estabelecer uma base de apoio. O problema é quando a base de apoio que se busca também pode impor travas maiores, como temos visto em muitas situações.
Há um caminho importante a ser traçado pelo País para alavancar um nível muito maior de investimentos, melhorando o ambiente de negócios e as condições de competitividade. Mas seguir por esse caminho depende muito da vontade política. Vontade que anda bem incerta.