O mercado tem oscilado no embalo das incertezas fiscais, embora também haja alguma influência do cenário externo. Mas o principal fator de pressão é doméstico mesmo.
Começou com a proposta da equipe de Lula de uma licença para gastar acima do teto de gastos, de quase R$ 200 bilhões, muito superior ao esperado, o que detonou uma onda de projeções alarmantes quanto à possível evolução da dívida pública, principalmente se for uma licença para todo mandato. Depois vieram declarações do próprio Lula priorizando o social em vez do fiscal e minimizando as reações do mercado, agravando as preocupações.
Detectados os problemas que a reação do mercado pode ter para a própria economia, saíram declarações para tentar acomodar as expectativas, como de Alckmin, Mercadante e do próprio Lula, além de integrantes da transição, no sentido de definir um arcabouço fiscal, ter responsabilidade com as finanças e avançar com as reformas. Mas como tudo isso vai ficar para o próximo ano, o mercado permaneceu em alerta.
Na sequência vieram propostas de senadores para reduzir o valor da PEC e o prazo de validade, só que se percebe um jogo de interesses políticos em meio às negociações, como preservar as emendas parlamentares, garantir apoio para a reeleição de Lira na Câmara e Pacheco no Senado, e assegurar cargos no novo governo. Contexto que demonstra que a força da velha política pode se sobrepor aos interesses fiscais e ainda impor maior fragilidade ao novo governo. A negociação do prazo da PEC pode, inclusive, levar a novas negociações nos próximos anos, abrindo possibilidade de mais barganhas, negociações de moedas de troca.
Todo esse impasse, sem uma maior participação direta de Lula, que continua tendo de poupar a voz, mais a indefinição do Ministério, onde o nome de Haddad ganha força, e propostas para a Petrobras que preocupam até em relação à política de preços, tiveram forte impacto no mercado. Houve momentos de maior pressão no câmbio, queda da Bolsa e destaque para a curva de juros que chegou ao maior patamar desde 2016, com custos bem mais elevados para a rolagem da dívida, o que traz problemas adicionais para o futuro governo.
Roberto Campos Neto, à frente do Banco Central, agora com autonomia para decisões garantida em Lei, reconheceu a mudança das expectativas e não descarta possível retomada da alta dos juros, no caso de efetiva piora do quadro fiscal. Ele reconhece a necessidade de programas para os mais vulneráveis, mas com transparência quanto ao que se pretende fazer para assegurar uma melhor trajetória da dívida pública e o tal arcabouço fiscal. Os impactos sobre os juros podem não ficar restritos às reações do mercado.
Correndo contra o tempo, para aprovar a PEC antes da virada do ano, Lula deve retomar as conversas na próxima semana, viabilizando uma proposta que tenha condição de aprovação rápida no Congresso. Só que, enquanto isso, reafirmando a fragilidade do compromisso político com o fiscal, o Congresso avança com projeto que pode excluir do teto deste ano uma série de despesas que serão pagas só em 2023, como a Lei Paulo Gustavo e da Previdência, permitindo ao atual governo um bom remanejamento de recursos entre os Ministérios, e a liberação, claro, de mais emendas.
Agora é aguardar pela definição do melhor cenário possível, até para que o País possa ter mais condições de fazer frente a esperada piora do cenário externo. Mesmo com a indicação de possível redução da dosagem de alta dos juros pelo Federal Reserve, ficam dúvidas quanto ao aumento total dos juros e o impacto recessivo sobre a economia dos EUA. Ainda tem no horizonte as dificuldades relacionadas à guerra na Ucrânia, o aperto monetário na Europa e os novos lockdowns na China.