Segunda-feira, 11 de janeiro. Coincidentemente, duas empresas anunciam a mesma decisão. Devido a mudanças no mercado, alterações na tecnologia e à necessidade de manter a competitividade, é necessário adotar medidas amargas. Cortar custos, fechar unidades e demitir pessoas. Decisões desse tipo são impopulares e têm consequências para além de quem as toma. Não apenas ceifam empregos diretos, como também prejudicam o faturamento e os lucros dos fornecedores, e podem provocar a extinção de empregos indiretos. Mesmo assim, cortes radicais de custos fazem parte da descrição de cargo de qualquer executivo à frente de uma empresa. A diferença são as consequências para quem coloca essas decisões em prática.
Ao anunciar o fechamento de três unidades da Ford no Brasil, com a demissão de 5 mil pessoas, Jim Farley, CEO global da montadora, foi claro. “A Ford está presente há mais de um século na América do Sul e no Brasil e sabemos que essas ações são muito difíceis, mas elas são necessárias para a criação de um negócio saudável e sustentável”, informou ele em um comunicado em que detalhava a decisão. Na segunda-feira (11), as ações da Ford fecharam a 9,30 dólares na Bolsa de Nova York, alta de 3,4 por cento ante o fechamento da sexta-feira (8), e mantiveram a trajetória de alta nos pregões seguintes. Na quarta-feira (13), os papéis fecharam a 9,78 dólares, alta acumulada de 8,7 por cento na semana. Farley permanece no cargo.
No mesmo dia, André Brandão, presidente do Banco do Brasil (BBAS3), anunciou uma reestruturação das operações, com o fechamento de 112 agências e um Plano de Demissão Voluntária (PDV) cujo objetivo era que 5 mil funcionários se desligassem voluntariamente. No dia do anúncio, as ações recuaram 1,6 por cento. Subiram um pouco nos pregões seguintes, mas desabaram na quarta-feira (13), amargando uma queda acumulada de 5,6 por cento. O motivo para a queda? Ainda se aguarda a confirmação oficial, mas a maioria dos observadores políticos de Brasília dá como certa a saída de Brandão do comando do banco.
Executivo experiente no sistema financeiro, Brandão fez carreira no HSBC Brasil e chegou à presidência antes da venda do banco para o Bradesco, em 2016. Antes de ser convidado a presidir o BB, ele trabalhava na filial americana do banco britânico. Brandão fez o que qualquer executivo responsável e competente deveria fazer para garantir a sustentabilidade e a perenidade da organização que preside. Ele e Jim Farley tomaram, ambos, decisões amargas, mas necessárias. A diferença é que um permanece no cargo (e deve até receber um bônus melhor, visto que as ações subiram) e o outro terá de buscar uma colocação, após sacrificar um posto elevado nas finanças internacionais. Por que um foi demitido e o outro não? Simples: um preside uma empresa privada, e o outro preside (ou presidia) uma companhia estatal.
A eventual e provável demissão de Brandão, indicado pelo ministro da Fazenda, Paulo Guedes, com a bênção de Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, mostra os problemas da gestão estatal. O fechamento de agências não foi uma surpresa. Brandão não acordou de mau humor na segunda-feira, chegou ao banco e disse “fechem as agências e demitam 5 mil colaboradores”. Ao contrário, o plano vinha sendo maturado há algumas semanas, e havia sido submetido ao Conselho de Administração do banco. A maioria das agências que seria fechada fica em cidades pequenas. São unidades pouco rentáveis, localizadas em cidades pequenas. A mudança não afetaria o crédito agrícola. Ao contrário, houve um reforço do pessoal dedicado ao agronegócio. No entanto, para prefeitos do interior do Brasil, é sinal de desprestígio se a cidade perde a agência do BB, mesmo que a maioria das transações seja realizada pelo celular. Prefeitos irados ligam para deputados e senadores, que ligam para governadores, que marcam hora no Palácio do Planalto. E o mal está feito.
A virtual demissão de Brandão por ter tomado as decisões difíceis que qualquer executivo tem de tomar mostra que, independentemente de quem ocupe a Presidência da República, as empresas estatais são um problema. Sua gestão não segue apenas os cânones da administração, mas também é influenciada pelos humores e pelas sombras da política. Por isso, independentemente da qualidade de sua gestão, empresas estatais sempre terão um risco adicional.
E Eu Com Isso?
A quinta-feira começa com as ações levemente em alta. As expectativas são positivas com o provável detalhamento, pelo presidente eleito Joe Biden, do novo plano de estímulo econômico a ser implantado nos Estados Unidos.