Em mais uma disputa com o governo paulista, as companhias do setor de concessões rodoviárias (CCR, Ecorodovias) pedem ressarcimento devido às perdas geradas pela pandemia, onde estima-se um impacto de 850 milhões de reais apenas considerando o auge do isolamento social, ocorrido entre março e junho. O governo de São Paulo, por outro lado, não concorda com a revisão dos termos contratuais (reequilíbrio) em função da queda de tráfego, afirmando ser este um risco a ser assumido pela concessionária.
Este é mais um caso de embate entre concessionárias e o estado de São Paulo, cujo ambiente regulatório encontra-se cada vez mais deteriorado, com a Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp), responsável pela regulação das concessões, acumulando elevado número de pendências com o setor. Acredita-se que a agência esteja sofrendo com limitações em sua tomada de decisão, devido à possível interferência política.
Embora o histórico de relacionamento entre a agência e as empresas seja problemático, há percepção de que a ingerência política aumentou após a chegada de Mauro Ricardo Costa à gestão em junho de 2020. Também houve apreensão com a indicação de Milton Persoli para a diretoria-geral da Artesp, cuja indicação foi interpretada pelo mercado como mais política do que técnica.
Outras apreensões ocorreram quando, em julho de 2020, a Artesp reverteu uma decisão sobre um reequilíbrio concedido à EcoRodovias (com ressarcimento de 1,6 bilhão de reais suspenso após queixa do governo) e, posteriormente, na reforma administrativa, quando foi adicionada cláusula (retirada, posteriormente) que limitava a autonomia da Artesp, com um artigo prevendo que qualquer medida da agência com impacto orçamentário deveria ser avalizada pelo governo.
Nos próximos meses, a atenção se centrará na troca de dois diretores da Artesp, cujos mandatos se encerram em dezembro.
E Eu Com Isso?
As informações são negativas para o setor de concessões rodoviárias, em particular para as empresas com maior exposição à malha paulista. Contudo, não esperamos um impacto imediato nas ações da CCR (CCRO3) e da EcoRodovias (ECOR3), pois esse dependerá da extensão das decisões das Artesp e seus desdobramentos, exigindo cautela por parte do investidor.
Em síntese, o artigo publicado sinaliza que a independência da Artesp como agência reguladora das concessões rodoviárias paulistas está novamente sob ameaça. Historicamente, a relação entre a agência e as empresas concessionárias é conturbada, como revelam as variadas disputas pendentes relacionadas a reequilíbrios contratuais.
No caso particular do pleito por um reequilíbrio, decorrente da abrupta queda de tráfego ocasionada pela pandemia, julgamos que há certa legitimidade ao argumentar que se trata de um evento de força maior. Decisões nesse sentido já foram tomadas em concessão detida pelo Pátria regulada pela própria Artesp, porém anteriormente à mudança de diretoria. Mesmo que a economia ainda fragilizada possa restringir os meios de aplicação do reequilíbrio, há alternativas além do aumento tarifário, como a extensão contratual, por exemplo, que não impacta os usuários.
De qualquer modo, independentemente do mérito do pleito, entendemos que a independência e a previsibilidade nas decisões são aspectos que devem ser valorizados pela agência e pelo governo. De fato, são determinantes para a viabilidade dos próximos leilões de rodovias, que somente atrairão interesse de investidores caso haja estabilidade regulatória e segurança jurídica. Portanto, o ponto de atenção aqui está nesses elementos e se a nova diretoria preservará a autonomia da agência.