Medidas governamentais de estímulo vêm sendo atrapalhadas pela grande incerteza que circula os mercados mundo afora. A vida dos profissionais de mercado é, em suma, traçar cenários. Seja para empresas, seja para commodities, taxas de câmbio e de juros, ou ainda para a atividade econômica. E, para traçar cenários, é preciso ter informações. Por isso, a pior praga para o mercado é a incerteza. O desconhecido. Situações em que não há nada para se comparar. Por isso a extrema volatilidade provocada nos mercados com a propagação da epidemia do coronavírus.
O fato de que milhões de pessoas ao redor do mundo podem ter de ficar trancadas em suas casas por um período indeterminado é algo inédito. Não há registros históricos de fato semelhante. Assim, a incerteza é enorme. E, na incerteza, uns vendem sem motivo e outros compram sem fundamento. Ambos podem estar certos – ou errados. E a probabilidade de ambos perderem preciosas fatias de seu patrimônio é elevada, o que contribui para o empobrecimento geral.
O governo em ação
Em circunstâncias “normais”, a promessa do governo de injetar 147 bilhões de reais na economia para conter a crise seria motivo para comemoração. Na segunda-feira (16), o Ministério da Economia anunciou várias medidas governamentais. O pagamento do abono salarial para os aposentados e beneficiários do INSS foi antecipado para junho, o que deve injetar 12,8 bilhões de reais na economia. Os valores não sacados do PIS/Pasep serão transferidos para o FGTS para permitir novos saques, o que representa mais 21,5 bilhões de reais na economia. Além disso, o pagamento da segunda parcela do 13º salário dos aposentados foi antecipado de dezembro para maio, representando mais 23 bilhões de reais. Haverá ainda um reforço de 3,1 bilhões de reais ao Bolsa Família, permitindo a inclusão de mais de 1 milhão de pessoas. Só essas medidas governamentais representam 60,4 bilhões de reais que deverão, muito provavelmente, serem injetados diretamente nas veias do consumo.
Além disso, é bastante provável que o Banco Central (BC) corte a taxa referencial Selic em meio ponto percentual (ou mais) na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que começa nesta terça-feira (17). Atualmente em 4,25 por cento ao ano, a Selic pode encerrar 2020 a 3,50 por cento, avaliam os profissionais do mercado segundo a edição mais recente da pesquisa Focus. Nada impede que esse corte de 0,75 ponto percentual seja feito de uma só vez.
Medidas governamentais de estímulo são a solução?
Recursos injetados na economia e juros mais baixos seriam motivos suficientes para que as mesas de negociação dos bancos começassem o dia eufóricas. No entanto, mesmo medidas governamentais contracíclicas tão profundas podem ser inócuas. Na melhor das hipóteses, seu efeito benéfico sobre o mercado pode ser de curta duração. Muito investidores que estão amargando prejuízos podem aproveitar uma alta momentânea para vender com menos perdas, comprometendo a trajetória de valorização.
O comportamento dos mercados acionários internacionais mostra isso. Mesmo com algumas Bolsas da Ásia ensaiando recuperação após os tombos de segunda-feira, 16, os pregões na China e na Coreia do Sul fecharam em baixa na terça-feira (17). Em Xangai, o índice SSE Composite caiu 0,34 por cento e fechou no menor patamar desde o início do ano, a 2.780 pontos. Em Seul, o índice Kospi caiu 2,47 por cento e em Tóquio, o índice Nikkei fechou com uma leve alta de 0,06 por cento.
Na Europa, os pregões começaram com uma recuperação nos preços após as fortes quedas da segunda-feira (16), mas não sustentaram o movimento. Na Alemanha, o índice Dax abriu com alta de 3,51 por cento, mas cedeu terreno e, no início da manhã no Brasil, estava com uma valorização de apenas 0,1 por cento. Em Londres, o FTSE abriu com alta de 1,58 por cento, mas agora mostra uma desvalorização de 1,83 por cento.
Indicadores
A Fundação Getulio Vargas (FGV) divulgou o Índice de Preços ao Consumidor – Semanal (IPC-S) referente à quadrissemana encerrada em 15 de março de 2020. A inflação subiu um pouco, para 0,04 por cento, e ficou 0,05 por cento acima da taxa divulgada na última apuração. A inflação subiu e seis das sete capitais pesquisadas. As maiores altas ocorreram no Rio de Janeiro, onde os preços da quadrissemana finda em 15 de março avançaram 0,17 por cento ante os 0,08 do período anterior, e em São Paulo, onde a alta foi de 0,15 por cento ante 0,09 por cento nas quatro semanas anteriores.
Os contratos futuros de Ibovespa estão começando o dia com alta de 3,9 por cento e o mercado futuro de S&P 500 avança 1,16 por cento. Um movimento positivo, mas nada indica que ele será duradouro. As notícias são positivas, mas espere um dia de forte volatilidade.
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