Levante Ideias - Federal Reserve

O Fed solta os falcões

O investidor americano John Templeton (1912-2008), fundador da gestora de recursos Templeton, costumava dizer que as quatro palavras mais perigosas para o investidor eram “desta vez é diferente”. Em geral pronunciadas em momentos de euforia do mercado, quando os preços sobem exageradamente, essas palavras indicavam que o investidor estava subestimando os riscos de uma correção nos preços. Porém, foi exatamente isso que Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed), o banco central americano, disse na quarta-feira (26). Ao comentar os resultados da reunião de dois dias do Fomc (Federal Open Market Committee), o Copom americano, Powell disse que “a situação da economia está diferente”. Ou seja, que a inflação está muito alta e que a política monetária do Fed vai mudar.

Após quase dois anos sendo leniente com a inflação, a autoridade monetária americana soltou seus falcões. No jargão do mercado, há duas abordagens possíveis para os bancos centrais. Eles podem ser pombos (em inglês “dovish”), ou mais tolerantes com a inflação, para que a política monetária não comprometa o ritmo da economia ou o nível de emprego. Ou podem ser falcões (“hawkish”), quando assumem uma postura mais estrita para manter estáveis os índices de preços. O Fed mudou de lado. Até agora, manteve a combinação de juros perto de zero com a injeção direta de recursos na economia para contrabalançar os efeitos negativos das medidas de restrição. Porém, isso vai mudar, e logo.

As declarações de Powell deixaram três pontos muito claros. O primeiro é que o Fed não tem mais dúvidas de que a inflação americana está elevada demais. “A situação não melhorou desde a última reunião de dezembro, de fato ela piorou um pouco”, disse Powell ao comentar os resultados.

Atualmente em 7% no ano calendário de 2021 quando medida pelo CPI (Consumer Price Index) e em 5,7% nos 12 meses até novembro, medida pelo índice PCE (Personal Consumption Expenditure), a inflação está muito acima da meta de 2% ao ano que deve ser perseguida pelo Fed. Mais do que isso, a economia está aquecida. O desemprego está em 3,9%, perto das mínimas históricas e em linha com o que o banco central considera, na prática, pleno emprego.

O segundo ponto é que os juros vão subir, e logo. Desde março de 2020, os Fed Funds, equivalentes à taxa Selic, são mantidos na faixa entre zero e 0,25% ao ano. Na prática, os juros são nulos. Powell praticamente garantiu que haverá uma alta em março. Ele não citou números, mas as expectativas são de que será um avanço de 0,25 ponto percentual. No entanto, o discurso mudou. A nova palavra é “ágil”. O presidente do Fed disse nada menos de três vezes durante sua entrevista coletiva concedida após a reunião que a autoridade monetária americana será “ágil” ao combater a alta de preços.

Até antes da reunião, a projeção era de que haveria no máximo quatro altas de juros neste ano, todas de 0,25 ponto percentual, de modo que os Fed Funds encerrassem 2022 a 1% ao ano. Agora, surge a hipótese de cinco elevações, pois Powell não foi claro quanto ao ritmo e à quantidade de alterações nas taxas.

O terceiro ponto é que o Fed vai zerar os estímulos à economia postos em marcha em março de 2020, e que levaram seu balanço à impressionante cifra de US$ 8,9 trilhões. Powell afirmou que esse processo deverá começar paralelamente à elevação dos juros, ou seja, ainda no primeiro trimestre deste ano.

Além de reduzir o tamanho de suas posições, o banco central vai reduzir sua ênfase em títulos lastreados em ativos imobiliários, como papéis privados garantidos por hipotecas, e concentrar os investimentos em título públicos. A meta, informou o comunicado da reunião, “é reduzir o impacto sobre a alocação setorial de crédito na economia”. O impacto de todas essas novas informações foi uma correção nos mercados americanos, com quedas dos principais índices de ações.

A avaliação do Fed sobre o aquecimento da economia poderá ser corroborada nesta manhã, com a divulgação da primeira prévia sobre o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) americano no quarto trimestre. A estimativa mais comum é de um crescimento de 5,5% em relação ao mesmo período de 2020, o que indica um ritmo acelerado para o crescimento econômico.

E Eu Com Isso?

Os contratos futuros do Ibovespa e do índice americano S&P 500 iniciaram a sessão com leves altas, reagindo à forte baixa da véspera (no caso dos Estados Unidos) e reagindo também ao fechamento em alta, mas abaixo da máxima do dia (no caso brasileiro).

No entanto, a divulgação do PIB americano no quarto trimestre e a continuidade do processo de ajuste dos mercados à atitude mais estrita do Fed poderá provocar volatilidade no mercado.

As notícias são positivas para a Bolsa em um cenário de volatilidade.

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Leia também: O Fed entre a cruz e a espada.

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