Hoje é domingo pós-Natal, dia em que normalmente você come (I) um pot-pourri dos pratos da ceia do dia anterior e (II) analisa mais friamente os presentes que ganhou e começa a pensar nas trocas. Esta segunda tarefa se assemelha um pouco aos tempos atuais de Bolsa: reavaliação de modelos e decisões de investimentos, como “qual ativo descartar? Qual adicionar?”
Ao longo do ano, mensuramos, como de costume, todos os setores da Bolsa – e assim o faremos em 2022. Por aqui, na Levante, chegamos a uma conclusão: o histerismo do mercado, muitas vezes camuflado no barulho das cenas política e midiática ou no tema da moda, acaba por prejudicar o “diálogo” do preço de tela das ações e o valor das empresas por detrás daquele ticker.
Como já falamos aqui: preço é o que você paga, valor é o que você leva – citando a conhecida frase de Benjamin Graham.
Um analista, colega meu na Levante, intitulou o dilema que vivenciamos em 2021 como um “dilema composto por quatro A’s”: inflação Alta, juros Altos, endividamento Alto e risco hidrológico Alto. Diante disso, torna-se mandatório o famoso “stock picking”, processo de escolha de ações com maior potencial de valorização, considerado o risco e o retorno de cada investimento, além das oscilações de mercado. É a ordem do dia na casa (e, imaginamos, será a ordem dos meses subsequentes).
Do “Dilema dos 4 A’s”, o último talvez seja, ao mesmo tempo, o menos controlável e o mais previsível. Os reservatórios preocuparam neste ano, mas o risco não se concretizou. A PSR, uma das consultorias mais respeitadas no setor, previa, em julho de 2021, risco de 29% de racionamento em 2022. Em setembro/20, o risco caiu para 20%. Há menos de um mês, essa projeção é de entre 2,1% e 8,8%. Já os outros três A´s, mais controláveis e talvez menos previsíveis, sofrem as atitudes dos Bancos Centrais e governos pelo mundo, que usam os artifícios em suas mãos para que possamos retomar o crescimento global.
A boa notícia é que, olhando um pouco mais adiante, o “clima” pode mudar, muito em função (I) da diminuição de pressões fiscais (que devem atingir o pico no fim de 2021), (II) da maior clareza dos riscos de racionamento de energia elétrica (até meados do primeiro trimestre) e (III) maior visibilidade do jogo político em torno das candidaturas para presidente (no 2º trimestre).
Fato é que o ano só acaba quando termina, e o processo de investir nunca se encerra. Tempo é dinheiro, e nossa função como casa de análise é otimizar isso para nossos clientes.
Voltando à mensuração do cenário e acrescentando a ela o fato de a liquidez em Bolsa ser reduzida em virtude dos feriados, a nossa principal carteira de stock picking fará um movimento diferenciado para esse fim do ano, buscando solucionar esses “problemas” se baseado nas assimetrias citadas acima. Caso queira conhecê-la melhor, basta clicar no botão abaixo:
Nesse cenário de troca de presentes e de troca de papeis do portifólio, nos chama atenção as ações de commodities (produtos de origem agropecuária ou de extração mineral, em estado bruto ou pequeno grau de industrialização, produzidos em larga escala e sem diferenciação), parcela importante do nosso PIB, seja pela geração de renda, pela exportação, pelo aumento do IDH, entre outros. Difícil imaginar uma retomada da economia sem uma retomada no preço de tela de algumas dessas companhias.
Mas, como sabemos, preço é o que pagamos… Então, valor é o que levamos, certo?
Portanto, vamos ao valor da Vale como exemplo bastante atual daquilo que estamos vivenciando em Bolsa e que representa o setor no detalhe.
Simplificando o Valuation da mineradora: é o clássico “preço vezes quantidade”. No lado da quantidade, o volume está praticamente dado para o ano: a própria empresa informou que a produção de minério de ferro deve ficar entre 320 e 335 milhões de toneladas para 2022. Já no lado do preço, a equação é um pouco mais complicada.
A montanha russa vista ao longo de 2021 traz algumas incertezas, mas, se olharmos com calma e separarmos sinais de ruídos, temos uma conclusão bastante interessante. Entendemos que, a partir de março de 2022, o preço do minério terá dois grandes catalisadores. São eles: (I) divulgação do orçamento da China para 2022 e (II) processo de reconstrução de estoque nas usinas siderúrgicas antes do Ano Novo Lunar (que normalmente começa na segunda metade de dezembro).
O mercado se antecipa a isso. Parte desse movimento já começamos a observar, na retomada dos preços do minério a 126 USD a tonelada. Comentamos acima que o processo de reconstrução de inventário nas usinas siderúrgicas se inicia na segunda metade de dezembro. Se olharmos o movimento de preço do minério nas últimas semanas, veremos que o mineral atingiu a mínima do ano em novembro e, desde então, engatou sequências de alta. Isso tem total correlação ao preço e também ao valor das companhias do setor.
Dentre esses catalizadores, o mais esperado, sem dúvida, é o orçamento. O país provavelmente deve trazer forte estímulo para o setor de infraestrutura, visando atingir o crescimento mínimo de 5% do PIB exigido pelo plano de cinco anos e priorizando a qualidade do crescimento ao invés da quantidade de crescimento. Já na redução do depósito compulsório no país asiático, a recuperação das minerados no mundo foi visível.
Correlações à parte, muito da situação de os preços não estarem conversando com valor nesse caso se deve ao fato de a Evergrande (gigante do setor de incorporação e construção chinês) dar default nos pagamentos de fornecedores e outros financiamentos. As ações derreteram no dia, mas procuro sempre trazer a projeção futura desse fato, que, neste momento, foi resolvido com o “poder da Caneta”.
O minério não depende de uma empresa, mas uma empresa depende do minério. As relações inversas ocorrem quando avaliamos os presentes recebidos no Natal – e também no mercado de capitais. Cabe a nós fazermos disso oportunidades.
Por fim, desejo boas festas nesse fim de ano a você e que aproveite esse momento com os queridos, nunca deixando de lado a diversificação dos investimentos, que são fundamentais para a prosperidade.
Um abraço,
Enrico Cozzolino