Na noite desta quinta-feira (18), o presidente da República Jair Bolsonaro, em sua live semanal, criticou o novo aumento no preço dos combustíveis anunciado pela Petrobras no mesmo dia.
Os aumentos foram 10 por cento para a gasolina e 15 por cento para o diesel, acompanhando as fortes altas no preço do petróleo nas semanas recentes, anabolizadas pelo preço do dólar em patamares historicamente altos.
O presidente afirmou que irá zerar os impostos federais que incidem sobre os preços dos combustíveis (que representam cerca de 15 a 17 por cento da composição total), para compensar a recente alta na refinaria, sem contrapartida de arrecadação por enquanto. A mudança valerá a partir do dia 01 de março.
Irritado com a alta dos preços que podem gerar mais pressões a respeito na negociação com os caminhoneiros, apesar de afirmar não interferir na companhia, disse que “alguma coisa vai acontecer na Petrobras nos próximos dias”.
Em oposição à pressão dos caminhoneiros, a Associação dos Importadores de Combustíveis (Abicom) vem afirmando que os preços dos combustíveis praticados pela Petrobras estão abaixo da paridade internacional e inviabilizam a atividade de muitos importadores no país, em uma competição desleal.
O representante dos acionistas minoritários e com assento no conselho, Marcelo Mesquita, sócio fundador da gestora Leblon Equities, afirma que as falas de Bolsonaro “dificultam a gestão da política econômica, da Petrobras e de todas as estatais” gerando volatilidade desnecessária e dificuldades para o ambiente de negócios no país.
E Eu Com Isso?
A fala do presidente é uma das mais preocupantes em termos de política econômica desde a sua posse em 2019, sinalizando ao mercado de que as estatais não terão vida fácil caso não atendam aos interesses e lobby de grupos específicos de sua base eleitoral.
Houve ruídos recentemente em relação ao plano de demissão voluntária anunciado pelo novo CEO do Banco do Brasil, André Brandão, que, segundo fontes, quase lhe custaram o cargo. Já a fala em relação à Petrobras se assemelha de alguma forma com o discurso da necessidade de controle de preços na gestão de Dilma Rousseff, em que os preços do petróleo (em 2013 e 2014) estavam acima dos 100 dólares por barril, episódio que culminou em prejuízos bilionários para a companhia.
A live de Bolsonaro gera uma incerteza grave sobre os rumos da companhia que, sob a gestão de Roberto Castello Branco (atual CEO), reduziu fortemente o endividamento que estava em níveis insustentáveis, recuperou e melhorou a rentabilidade das operações, enxugou a empresa vendendo ativos que só consumiam caixa, de modo que mesmo com preços de petróleo em patamares baixos, a companhia é capaz de gerar caixa positivo e mira até a volta de pagamento de dividendos.
As repercussões terão consequências negativas para as ações da Petrobras. A ambiguidade das falas do presidente levanta dúvidas sobre a possibilidade de maior ingerência política dentro da companhia, inclusive com o surgimento de rumores de uma possível demissão do atual CEO. Esse nível de incerteza atrapalha demasiadamente uma precificação justa das ações da Petrobras.
Os impactos de uma possível intervenção na Petrobras podem ir além de simplesmente gerar prejuízos financeiros. Pode afugentar o capital estrangeiro para investimentos, o que já vem ocorrendo no país de alguma forma. A fuga pode se espalhar não somente nos ativos em processo de venda pela companhia (refinarias principalmente), mas também em ativos nos setores de infraestrutura, energia elétrica e em todos os setores que há alguma regulamentação estatal mais firme, com consequências sobretudo no médio e longo prazo.
Análise Complementar – composição dos preços dos combustíveis
No levantamento de dados mensal realizado pela ANP, a composição média dos combustíveis na ponta, para o consumidor final é o seguinte:
40 por cento é o preço do combustível à venda na refinaria (Gasolina + Etanol Anidro ou Diesel).
16 por cento de Tributos Federais (PIS/Cofins, Pasep, Cide)
28 por cento de Tributos Estaduais (ICMS predominantemente)
16 por cento restantes de Margem Bruta de Distribuição.
Ou seja, mais da metade do preço praticado nas bombas não é proveniente dos preços praticados nas refinarias. Os tributos têm um peso grande e tem sua razão de ser: é um dos principais meios dos Estados arrecadarem recursos, sendo um bem essencial e pouca volatilidade na demanda, sendo uma fonte segura de arrecadação de impostos e recursos para manter a máquina pública em funcionamento.
Mas olhando para a paridade de preço praticado pela Petrobras, que é o assunto do momento, na última vez em que as cotações do petróleo Brent (preço de referência) estavam nos patamares acima de 60 dólares (em 2015), o dólar operou na média de 3,45 reais no ano, cerca de 63 por cento abaixo do câmbio de hoje.
Lembrando que o custo da Petrobras de produção do combustível é em dólar, com repasse de preço na refinaria já em reais, sendo o efeito câmbio, assim como no preço de todos os materiais básicos utilizados no país (Agronegócio, carne, minério de ferro e aço), sofrem um impacto fortíssimo com o câmbio. Assunto que curiosamente não é citado pelo governo federal nessa disputa em torno dos preços de combustíveis no país, que a nosso ver, merece uma atenção nessa prateleira de discussões.