Levante Ideias - Domingo de Valor

Transparência das empresas na Bolsa de Valores

Na coluna de hoje, vou falar sobre: i) minha experiência na área de relações com investidores (RI), ii) o conceito de transparência na divulgação de informações das empresas da Bolsa (“fair disclosure”) e; iii) contar uma boa história do meu tempo na área de RI (atendendo a pedidos dos meus leitores).

 

Relações com investidores (RI)

As empresas de capital aberto na bolsa de valores têm uma área muito importante para se comunicar com o mercado financeiro: a área de Relações com Investidores (RI). Resultados trimestrais, comunicados ao mercado, fatos relevantes e apresentações corporativas são fontes muito ricas de informação para os analistas de ações que acompanham as empresas.

Eu trabalhei com analista de RI na empresa de papel e celulose Klabin S.A. no começo da minha carreira de finanças corporativas.

 

Fair disclosure

O princípio do “fair disclosure” (FD) significa transparência e isonomia na divulgação das informações, ou seja, informações relevantes sobre uma empresa de capital aberto devem ser divulgadas ao mesmo tempo para todos os investidores, sem privilegiar nenhum participante do mercado com informações importantes sobre a empresa.

O FD é uma regra/princípio do órgão regulador do EUA, a Securities and Exchange Commission (SEC), equivalente à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) aqui no Brasil.

 

Fato relevante

O conceito de fato relevante é bem simples: acontecimentos que podem afetar o preço das ações ou influenciar a decisão dos acionistas de comprar, manter ou vender as ações de uma determinada empresa.

Alguns exemplos de fatos relevantes são: resultados trimestrais, fusões e aquisições, anúncios de projetos de expansão e informações operacionais das empresas.

 

Insider trading (informações privilegiadas)

Eu gosto muito de filmes sobre o mercado financeiro. Um dos melhores é “Wall Street, poder e cobiça” com o famoso personagem Gordon Gekko interpretado pelo ator Michael Douglas.

O personagem de Gordon Gekko negocia ações de empresas listadas na bolsa dos EUA com base em informações privilegiadas a que o grande público não tem acesso. O “insider trading” é crime e os órgãos reguladores (SEC/CVM) são o “xerife” do mercado de capitais. No fim,  o personagem acaba condenado e preso (desculpe pelo spoiler).

 

Divulgação de resultados das empresas

Como analista de relações com investidores da Klabin eu tinha acesso às informações gerenciais mensais sobre a companhia. Regularmente eu falava com analistas de ações do mercado que acompanhavam/cobriam a companhia.

As empresas sempre precisam informar ao mercado a data de divulgação dos seus resultados trimestrais. É o chamado calendário de eventos corporativos que é divulgado pelas empresas no site da CVM e nos sites de RI das companhias.

Durante o período de silêncio, que se inicia  15 dias antes da divulgação dos resultados trimestrais ou anuais, a área de RI das empresas não discute/fala sobre os números da companhia com os investidores.

A temporada de resultados do terceiro trimestre de 2020 está para começar, com as datas de divulgação definidas, portanto algumas empresas já estão em período de silêncio e a área de RI não está falando sobre os números do trimestre com os analistas/investidores que cobrem a empresa.

 

Release de resultados

Na minha opinião o principal produto/informação de uma empresa é a divulgação do resultado trimestral, composto por: release de resultados, informações financeiras (ITR), apresentação e teleconferência de resultados.

Na divulgação de resultado trimestral, a empresa divulga as principais informações financeiras e operacionais da companhia e “conversa” com o mercado divulgando as informações demandadas pelos investidores e respondendo às perguntas dos investidores na teleconferência de resultados.

Na prática a área de RI precisa ter o release pronto (arquivo em PDF) e divulgar a informação simultaneamente para todo o mercado (investidores), de maneira a respeitar o “fair disclosure”.

Eu me lembro bem da minha época de RI na Klabin: a gente colocava o release/ITR no site da CVM, mandava por e-mail para os analistas/investidores e colocava no site de RI da Klabin.

Havia sempre uma grande expectativa para as perguntas dos analistas/investidores sobre os números e a equipe toda de RI ficava a postos na teleconferência de resultados. Pessoalmente, acredito que o dia da divulgação de resultados tinha aquela adrenalina, responsabilidade e profissionalismo.

Algumas empresas que divulgam os seus resultados depois do fechamento do pregão da B3, que se encerra geralmente às 18 horas, acabam divulgando os seus resultados tarde na noite/madrugada, o que na minha opinião pode ser considerado uma má prática de RI.

Empresas com bom RI devem divulgar o seu resultado até  as 19 horas e disponibilizar as informações em todas as mídias (site de RI e da CVM, e-mail e redes sociais).

As empresas que divulgam as informações cedo no horário correto e respeitando o “fair disclosure” facilitam o trabalho de analista de ações e dos investidores que acompanham/cobrem a companhia.

 

Histórias da área de RI

Além de falar com analistas e investidores, a área de RI também precisa falar com a imprensa.

O meu gerente de RI da Klabin certa vez deu uma entrevista para um jornal local sobre uma parada de manutenção de umas das plantas industriais da Klabin em Santa Catarina.

Acredito que a comunicação não foi ideal e acabou saindo na imprensa a notícia que a Klabin estaria “fechando” umas de suas fábricas em Santa Catarina.

O gerente geral de recursos humanos corporativo precisou ir até a fábrica explicar para os trabalhadores, que trabalham em três turnos de oito horas (afinal fábrica de papel nunca para), que a Klabin não iria fechar a planta e que eles não perderiam os seus empregos!

Essa foi uma das melhores lições que eu tive sobre a profissão de relações com investidores: sempre tomar cuidado com as entrevistas com a imprensa.

Por último, gostaria de agradecer aos profissionais de relações com investidores das empresas que eu acompanho aqui na Levante.

Grande abraço,

Eduardo Guimarães

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