Esses dias, estava assistindo a uma entrevista com o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB). Apesar de ser jovem – o tucano tem apenas 34 anos –, ele se mostrou um político com ideias promissoras.
Chamou-me a atenção, especificamente, um ponto de vista colocado pelo governador quando este traçava comentários acerca dos tributos sobre o combustível e da faísca entre o Planalto e os governadores. Segundo ele: “Comunicação não é o que você fala, mas o que o outro entende.”
A frase é simples, mas existe uma abissal diferença entre os termos e, mais ainda, uma profunda interpretação por detrás de uma construção tão sucinta. Veja: comunicar-se é, claro, falar algo. No entanto, uma boa comunicação está, fundamentalmente, nos receptores da mensagem. O orador, neste caso o sujeito da ação, é secundário – por mais contraditório que isso pareça. Comunicar-se brilhantemente envolve transmitir exatamente a mensagem que levou o sujeito a construir aquele raciocínio.
Por isso, uma boa comunicação alinha, inevitavelmente, o entendimento de outrem com o que o orador falou. Uma má comunicação, por outro lado, acarreta interpretações diferentes sobre o que foi dito. Basicamente, o sujeito disse (ou, como falamos, quis dizer) X, mas os receptores da mensagem entenderam Y. Na política, a arte do diálogo, esse efeito é multiplicado – para o bem e para o mal.
Assim sendo, é fato incontestável que figuras relevantes do Governo Federal têm se comunicado mal. Recentemente, o protagonista do besteirol tem sido o ministro da Economia, Paulo Guedes.
Guedes conseguiu cair nas graças dos críticos não uma, mas duas vezes em decorrência de duas frases descuidadas ditas pelo ministro. O manual das boas práticas de comunicação com certeza não saiu da estante. E não adianta argumentar sobre possíveis más interpretações do que ele quis dizer nem que suas frases foram condenadas fora de contexto. De novo, não interessa o que você fala, mas sim o que o outro escuta.
Na primeira ocasião, o ministro da Economia comparou servidores públicos a parasitas. Segundo ele: “O funcionalismo teve aumento de 50% acima da inflação, tem estabilidade de emprego, tem aposentadoria generosa, tem tudo, o hospedeiro está morrendo, o cara virou um parasita, o dinheiro não chega no povo e ele quer aumento automático, não dá mais.”
De fato, não há nenhuma condição financeira para que o funcionalismo público se sustente. É aquela situação: o ministro não está errado, mas perde toda a efetividade da mensagem ao esbarrar em uma comparação chula. Após alguns dias, Guedes procurou a imprensa para pedir desculpas pela analogia, mas os efeitos já tinham sido sentidos. Diversas manifestações vieram da classe política, de grupos organizados do setor público e até de aliados do governo, que não gostaram do tom da mensagem.
Nesse contexto, pesou a declaração para o governo recuar sobre a reforma administrativa. Foi constatado que não havia clima político nenhum para enviar a proposta após a fala de Guedes. Nesse meio, palavras custam caro…
Poucos dias depois, o ministro foi comentar sobre o dólar alto e afirmou que havia “uma festa danada” com o dólar baixo, em que até “empregada doméstica” ia à Disneylândia. Outro deslize – daqueles que não passariam despercebidos.
Do ponto de vista econômico, o pior é a mudança de discurso do ministro. Em meados de 2018, vale lembrar que um dos argumentos para não votar nos adversários de Bolsonaro era de que o dólar iria atingir suas máximas. Hoje, o discurso aponta para uma normalidade do dólar nesse patamar. Realmente, o dólar a R$ 4,30 não é um problema. Ademais, interferências no câmbio devem ser o último recurso. O discurso mudou, mas ficou estranho.
Segundo Guedes: “Um câmbio um pouquinho mais alto […] é bom para todo mundo. Mais exportação, mais substituição de importações, inclusive em turismo.” É só olhar para os anos 80 para constatar que a substituição de importações é uma alternativa fadada ao fracasso. Mas deixemos a economia de lado.
Ainda que o dólar esteja acima de quatro reais e que essa seja a nova realidade da moeda brasileira, fica difícil pensar em um exemplo pior para comunicar esse fato do que o usado pelo ministro. Tudo bem, todo mundo estava viajando para os EUA. Mas por qual motivo enfatizar a empregada doméstica? Há algo diferente nessa classe de trabalhadores(as)?
O economista deu um prato cheio para a oposição voltar a afirmar que ricos, liberais, banqueiros etc. odeiam pobres. Por descuido, reforçou uma narrativa que não tem nenhum embasamento teórico ou mesmo empírico.
Agora, o governo tem que aguentar todo o criticismo. Não há análises, comentários ou tweets suficientes para justificar as duas recentes pisadas na bola. O ministro da Economia tentou falar de economia, mas o público se atentou às infelizes analogias. Se arrependimento matasse…
Um grande abraço,
Felipe Berenguer
[email protected].
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