Na última sexta-feira (3), foi divulgada uma nova pesquisa de avaliação de governo em meio à pandemia do novo coronavírus. Nesta pesquisa, uma amostra da população brasileira foi questionada sobre as atuações do governo federal e dos governos estaduais no combate à Covid-19, seus impactos na economia e as expectativas de deterioração da renda e do emprego, assim como sobre a duração do isolamento social, entre outras perguntas.
Assim, na coluna de hoje, vou apresentar e analisar alguns dados importantes sobre a atual conjuntura, utilizando, para isso, pesquisas elaboradas pela XP Inc. em parceria com o Instituto de pesquisas sociais, políticas e econômicas (Ipespe), em especial as últimas duas, divulgadas em abril e março. Escolhi os levantamentos da XP em detrimento de outros institutos de pesquisa não só pela qualidade do material, mas principalmente pela frequência mensal de realização das rodadas de pesquisa. Isto permite um acompanhamento mais próximo das percepções da população.
As pesquisas são de cobertura nacional e ouviram, por meio de entrevistas telefônicas realizadas por operadores, uma amostra 1.000 pessoas distribuídas de acordo com as proporcionalidades de sexo, região, porte do município e idade da população brasileira. A rodada de março teve período de coleta nos dias 16 a 18 do mesmo mês de 2020. A rodada de abril, por sua vez, realizou o questionário entre os dias 30 de março e 1 de abril. Em ambos os casos, a margem de erro é de 3,2 pontos percentuais, para cima ou para baixo, e o Índice de Confiança de 95 por cento.
Avaliação dos agentes políticos em tempos de coronavírus
O primeiro recorte dos resultados diz respeito às tradicionais avaliações de governo feitas pela população. Tal medida tem como objetivo captar a popularidade dos governantes e tende a variar no tempo conforme a atuação dos agentes políticos para solucionar problemas relevantes em seus mandatos. No primeiro gráfico, encontrado logo abaixo, temos a avaliação do governo desde o fim do mandato Temer até a pesquisa mais recente. Lembrando que o emedebista era altamente impopular, por isso sua avaliação reflete uma alta porcentagem de respostas negativas.
Destaca-se o comportamento da avaliação positiva, a qual subiu de 10 por cento, na pesquisa de fevereiro deste ano, para 18 por cento no levantamento de abril. De março a abril, a avaliação negativa caiu na mesma proporção (8 p.p). Em suma, dentre diversos fatores, é possível atribuir a melhora da percepção sobre o Congresso à Covid-19.
O mesmo vale para a avaliação dos governos estaduais, que entraram em rota de colisão com o presidente nas últimas semanas ao discordarem de algumas medidas de afrouxamento do isolamento social propostas pelo Planalto. De março para abril de 2020, a porcentagem de entrevistados que avaliaram os governos estaduais como “Ótimo/Bom” saltou de 26 para 44, enquanto a avaliação de “Ruim/Péssimo” decresceu de 27 para 15 pontos. Observando o gráfico abaixo, é possível ver essas movimentações.
Impressões sobre a Covid-19
Alguém pode questionar se o aumento da popularidade de governos estaduais e do Congresso, em detrimento de uma piora da avaliação do governo federal, tem relação causal com o coronavírus. De fato, não há como provar tal causalidade. Do ponto de vista qualitativo, porém, o embate de narrativas sobre as melhores medidas para combater o coronavírus aponta para um alinhamento maior da população com os governadores e com o Congresso. Até porque o isolamento social mais rígido, em contraposição a ideias como o isolamento vertical, foi adotado mundo afora e reforçado por órgãos internacionalmente respeitados, como a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Na verdade, até os números das pesquisas dão suporte à explicação da perda de popularidade do governo federal por conta de sua postura em relação à Covid-19. Segundo a pesquisa de abril, 80 por cento dos entrevistados acreditam que o isolamento social é a melhor forma de se prevenir do novo coronavírus e, também, de enfrentá-lo. Por outro lado, 12 por cento acreditam que o isolamento está sendo exagerado e 6 por cento responderam que esta medida não é a melhor para se enfrentar a crise. O restante (3 por cento) não soube ou não quis responder.
Da mesma forma, 60 por cento da amostra discordou totalmente (48) ou em parte (12) em relação à possibilidade de volta, por meio da manutenção do isolamento social apenas para grupos de risco, das atividades escolares, empresarias e comerciais. Da parcela que concorda com a medida (34 por cento), apenas 12 por cento concordaram totalmente. O restante não soube ou não quis responder.
As respostas acima delineiam um perfil menos arrojado no combate à Covid-19, tendendo a seguir medidas consideradas mais consensuais ao redor do mundo.
No gráfico acima, podemos reforçar a possível queda de popularidade do presidente em função de sua avaliação no combate ao coronavírus no Brasil. Bolsonaro é o pior avaliado entre todos os atores envolvidos – perdendo até para o Congresso Nacional e o STF. Isto indica que, apesar de ter uma base de apoiadores engajada e bastante fiel, fora desses cerca de 30 por cento, o presidente não obteve boa avaliação até agora.
Destaque, também, para a alta avaliação positiva do ministro da Saúde, Henrique Mandetta, e sua pasta (68 por cento), assim como dos governadores (59 por cento). Curiosamente, os dois grupos vêm trocando farpas com o presidente.
As percepções sobre a economia
Outra variável importante que deve ditar a avaliação do governo daqui para a frente é a economia. Já é consenso entre todos que o coronavírus trará impactos negativos para a economia brasileira, assim como para a situação financeira pessoal da grande maioria da população. Os entrevistados já demonstram preocupação com esse cenário, como podemos observar no gráfico abaixo.
Já foram publicados diversos estudos que correlacionam o desempenho da economia e a avaliação do mandato de presidentes. Via de regra, uma economia forte e com níveis altos de confiança vem acompanhada de avaliações majoritariamente positivas para o governante surfando a onda, e vice-versa. Bolsonaro sabe disso e, por este motivo, vem insistindo na retomada das atividades econômicas o mais cedo possível. Até porque a percepção sobre os rumos da economia acabou virando devido ao coronavírus (veja o gráfico abaixo).
Diante dessa nova dinâmica, a população já começa a ficar receosa quanto aos riscos de perderem seus empregos e, até mesmo, de inadimplência. O alto grau de incerteza sobre o futuro não só afeta negativamente o consumo de famílias como também mina a confiança de empresários e do setor produtivo como um todo. A desaceleração econômica veio por meio de um fator exógeno e não previsto, acentuando mais ainda as perspectivas negativas em função de um componente de irracionalidade neste momento. Em ambos os gráficos abaixo, é perceptível o aumento da preocupação dos entrevistados sobre os seus próprios sustentos.
Conclusão
Em suma, é possível inferir que a popularidade do governo decresceu nesses dois últimos dois meses em função de dois pontos importantes: da sua atuação no combate à Covid-19 e de reflexos de um maior receio sobre os rumos da economia e sobre as perspectivas futuras de renda e emprego por parte da população.
No primeiro caso, o presidente parece ter feito a escolha de permanecer com um discurso um pouco mais radical sobre o coronavírus também por dois motivos: a) por querer retomar as atividades econômicas o mais rápido possível, arriscando diminuir os efeitos negativos sobre a economia, mas podendo acarretar um possível aumento no número de contaminações e mortes; e b) para continuar em constante diálogo e alinhamento com a sua base eleitoral, atacando outros Poderes, entes federativos e a imprensa tradicional.
Já no segundo caso – sobre os rumos da economia –, o governo tem a oportunidade de praticar uma série de políticas econômicas expansionistas para mitigar os impactos nos setores produtivos do País e no bolso do trabalhador brasileiro. Nesse sentido, caso as medidas implementadas sejam efetivas, uma eventual melhora nas perspectivas econômicas será acompanhada de uma recuperação da popularidade do Planalto. Tudo dependerá da ação e comunicação do governo, assim como da credibilidade do ministério da Economia. O mundo inteiro irá enfrentar uma recessão econômica em 2020, mas aqueles que souberem se recuperar da melhor forma podem colher frutos já em 2021.
Um abraço,
Felipe Berenguer
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