Na semana passada, a newsletter abordou a polêmica questão da votação secreta para a presidência da Câmara dos Deputados e também Senado Federal. Aproveitei e deixei uma pista sobre o tema deste sábado, me referindo ao cenário óbvio que se desenha para a eleição das duas casas legislativas.
Ao decorrer dessa semana, no entanto, tivemos um assunto relevante para a política e investimentos: Jair Bolsonaro fez sua estreia internacional como presidente da República, no Fórum Econômico Mundial na cidade de Davos, Suíça. O discurso deu o que falar nos principais veículos da imprensa brasileira, mas não chegou a surpreender os investidores. A repercussão por aqui foi de que o discurso não desagradou, mas poderia ter sido melhor.
Diante da minha vontade de desenvolver melhor o tema das eleições no Congresso, marcadas para a próxima sexta-feira (1/fev.), e do meu (ainda maior) desejo de analisar os 6 minutos – dos 45 disponíveis – de Bolsonaro em Davos, tomarei a liberdade de compilar 2 Política sem Aspas em 1. Ou até melhor, dividir o quadro em ‘Política Externa sem Aspas’ e ‘Política Doméstica sem Aspas’.
Por aqui
Brincadeiras à parte, parece bem óbvio quem serão os próximos presidentes da Câmara e do Senado. Na câmara baixa, Rodrigo Maia é favoritíssimo à reeleição. O deputado do DEM-RJ conta com apoio formal de 11 partidos de diferentes perfis, do PCdoB e PDT ao PR e PSL. Ao maciço apoio, soma-se o fato de que os outros candidatos não vêm se mostrando adversários à altura.
Até agora, são 8 os concorrentes de Maia: Capitão Augusto (PR-SP), João Henrique Caldas (PSB-AL), Fábio Ramalho (MDB-MG), Alceu Moreira (MDB-RS), Marcelo Freixo (PSOL-RJ), Kim Kataguiri (DEM-SP) e Ricardo Barros (PP-PR). Todos com pouca expressividade e limitado apoio político, devendo não representar ameaças a Maia.
O que pode complicar o favorito à reeleição é o alto número de concorrentes – o que aumenta as chances de pulverização dos votos, o que levaria a um segundo turno. Esse cenário abre espaço para uma grande articulação de oposição. Pelo menos no primeiro turno, esse não é um risco para o deputado do DEM.
Na câmara alta, o favorito é Renan Calheiros (MDB-AL). Aí que entra a bagunça. Como as candidaturas são registradas no próprio dia da votação, não há a certeza de quem e quantos serão os candidatos à Presidência. Renan tentaria a sua quinta legislatura à frente da mesa do Senado, mas garantiu que não tem essa intenção. Nos bastidores, acreditam que o alagoano está blefando.
De qualquer forma, são 8 pré-candidatos à posição: Álvaro Dias (PODE-PR), Ângelo Coronel (PSD-BA), Davi Alcolumbre (DEM-AP), Espiridião Amin (PP-SC), Major Olímpio (PSL-SP), Renan Calheiros (MDB-AL), Simone Tebet (MDB-MS) e Tasso Jereissati (PSDB-CE).
O mesmo fenômeno com Maia ocorre com Renan. A grande quantidade de candidatos não traz nenhum adversário forte o suficiente para ameaçar seu favoritismo. Nomes de peso da política tradicional, como Espiridião Amin e Tasso Jereissati, não conseguiram angariar apoio do novo grupo de senadores recém-eleitos. Simone Tebet, também do MDB, confirmou que irá se candidatar e pode ser páreo para o experiente senador emedebista, mas depende também da união de todos os outros postulantes por um bem comum: derrotar o “coroné” de Alagoas.
Sexta-feira que vem, o suspense estará encerrado e saberemos quem serão os novos comandantes das duas câmaras do Congresso. É importante se atentar ao resultado, por conta da importância da relação do Executivo com os futuros presidentes.
Vale reforçar o papel dos presidentes na condução dos projetos de lei nas casas legislativas e, por isso, eles são fundamentais para o ano de 2019. Principalmente com relação às agendas econômicas, ter uma boa relação com os chefes de cada câmara é essencial para encurtar caminhos e acelerar a tramitação de muitas matérias –ainda mais nessa corrida contra o relógio do ajuste fiscal brasileiro.
Por lá
No país do chocolate e dos relógios, Bolsonaro perdeu a chance de adoçar ainda mais a lua de mel com os investidores. Em um discurso curto, somente passou por cima de temas como abertura comercial, ajuste fiscal, reformas e privatizações.
Sejamos justos, paixões deixadas de lado: o novo presidente cumpriu o protocolo e nada mais. Fica aquele gosto (amargo) de “quero mais” após o fim de seu discurso. Isso se refletiu, inclusive, nas perguntas do presidente do Fórum, Klaus Schwab. O entrevistador pediu mais detalhes sobre, por exemplo, o fato do governo “gozar de credibilidade para fazer as reformas que precisamos e que o mundo espera de todos nós”. O que é esse novo Brasil? Que reformas? Como? Em quais moldes?
A resposta de Bolsonaro foi genérica: diminuir o tamanho do estado, realizar as reformas da Previdência – até então não citada diretamente – e a tributária, tirar o peso do estado de quem produz e quem empreende e investir na educação, ainda ineficiente no Brasil.
Por isso, faltou dar um tempero para o discurso de Bolsonaro. Talvez alongar um pouco mais, talvez até mantê-lo conciso, porém, sob uma eloquente narrativa. No ano passado, o ex-presidente Michel Temer falou no mesmo fórum por praticamente meia hora e, nos primeiros segundos do discurso, deu o tom da sua narrativa. Afirmou: “Quero, desde já, trazer-lhes uma mensagem muito clara, resumida em uma frase – o Brasil está de volta”.
Foi a primeira aparição de Bolsonaro e ele fez sua lição de casa. Há uma evolução em curso, tanto na postura quanto no discurso. Cada vez mais, o truculento candidato à Presidência dá lugar ao líder de Estado. Agora, esperamos o tempo para remediar os eventuais discursos insossos e torná-los à altura do desafio que se coloca para o país.
Um abraço,
Felipe Berenguer
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