Dando continuidade à temática da terceira via e seus postulantes, hoje o texto traz explicações e análises sobre as eleições prévias do PSDB, que devem definir quem será o candidato à Presidência da República do partido em 2022. Na semana passada, falei um pouco mais sobre as reais chances de um candidato alternativo prosperar no ano que vem – confira aqui.
As prévias tucanas funcionam sob a mesma lógica das prévias presidenciais nos EUA. Aqueles que têm interesse em se candidatar para cargos majoritários se inscrevem até uma data-limite e, assim, concorrem internamente para representar a legenda.
Na atual disputa, três nomes estão concorrendo à vaga de candidato à Presidência: o governador de São Paulo, João Doria, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e o ex-prefeito de Manaus (AM), Arthur Virgílio Neto. O senador cearense Tasso Jereissati também participava das prévias, mas anunciou, nesta semana, sua desistência em prol do apoio ao governador gaúcho. A tendência é que, em algum momento até novembro – quando ocorre o pleito – Virgílio também largue a disputa e apoie o governador paulista.
Nesse cenário, brigam pela vaga presidencial os dois governadores, em uma prévia que promete ser bastante acirrada. Leite é apontado como a “cara jovem” do partido e capacitado para atrair o apoio de outros partidos e setores de fora do PSDB, enquanto Doria tem em mãos a máquina do mais populoso e mais rico estado de toda a federação.
As prévias tucanas estão marcadas para o dia 21 de novembro e, caso nenhum candidato atinja a maioria absoluta dos votos válidos (50%+1) na ocasião, há a possibilidade de um segundo turno no domingo seguinte.
A fim de representar completamente os diferentes quadros políticos do partido – dos filiados aos presidentes – o PSDB adotou um sistema de Colégio Eleitoral, com quatro grupos diferentes de votantes. Estão autorizados a votar todos aqueles que tenham se filiado à legenda até o dia 31 de maio deste ano. Atualmente, a sigla conta com cerca de 1,4 milhão de filiados e a esmagadora maioria desse montante tem direito a voto.
Os grupos de votantes estão divididos entre filiados (grupo I), prefeitos e vice-prefeitos (grupo II), vereadores deputados estaduais e distritais (grupo III), e governadores, vice-governadores, senadores, deputados federais, ex-presidentes e o atual presidente da Executiva Nacional do partido. Cada grupo tem peso unitário de 25% do total de votos válidos e o vencedor será estipulado pela soma dos resultados de cada grupo.
O cálculo dos votos dos grupos é simples: em cada colegiado, os votos de cada candidato são divididos pelo número total de eleitores e o resultado é multiplicado por 0,25. A única exceção é feita no grupo III, em que se optou por dividir em dois subgrupos – um deles apenas com deputados e o outro apenas com vereadores. Nesse caso, a lógica do cálculo é a mesma, mas o resultado é multiplicado por 0,125, para efeitos de coerência com o peso final.
Tendo o modelo em vista, é bom nos atentarmos a alguns números relevantes dos tucanos. Atualmente, o partido conta com 3 governos estaduais, 7 cadeiras no Senado Federal, 33 deputados federais, 72 deputados estaduais e 4.377 vereadores espalhados pelo Brasil. Ainda no âmbito municipal, o PSDB conta com quase 600 prefeituras, além de aproximadamente 400 vice-prefeitos – não necessariamente nessas mesmas cidades.
No grupo II, João Doria parece ter alguma vantagem significativa. Isto porque das quase 600 prefeituras tucanas, cerca de 220 são redutos paulistas e simpatizam com o governador de seu estado. Por outro lado, Leite desponta na grupo IV, que reúne os grandes caciques tucanos e conta com nomes como Aécio Neves (MG), Geraldo Alckmin (SP) e Tasso Jereissati (CE) – os dois primeiros publicamente contrários ao nome de Doria por serem adversários políticos e o último mais alinhado com as ideias do candidato gaúcho.
Se há favoritismos em dois dos quatro grupos, quando o assunto chega aos grupos votantes mais numerosos – filiados e vereadores, deputados – o diagnóstico é completamente inconclusivo. Entre filiados, a opinião popular prevalece dividida ao enxergar Leite como mais carismático e Doria como mais preparado – tornando a dinâmica do voto muito subjetiva.
Já nos diretórios estaduais, há ainda muitos apoios em aberto: sete estados, que tem peso de 33,36% nas prévias, segundo levantamento interno da legenda, anunciaram apoio a Leite (MG, RS, PR, BA, CE, AL e AP) e cinco diretórios estaduais, com peso de 30,89%, fecharam respaldo ao governador paulista (SP, PA, DF, AC e TO). Evidentemente, existirão dissidências em ambos os lados, o que torna a situação virtualmente parelha.
Estão previstos cinco debates entre ambos os candidatos, com início a partir do dia 18 de outubro e provável transmissão aberta. A acareação dos governadores pode ser decisiva para o resultado final, haja vista que está em jogo, também, a simpatia dos eleitores tucanos pelo nome que tenha a maior força para encabeçar a chamada terceira via nas eleições presidenciais de 2022.
De qualquer modo, o PSDB tenta se recuperar do estrago ocorrido em 2018, quando Geraldo Alckmin – candidato com a maior coligação, tempo de TV e rádio e recursos públicos – teve desempenho pífio e ficou aquém dos 5% no resultado final, perdendo o grosso dos votos tucanos para o então candidato à Presidência, Jair Bolsonaro.
Para os mais apegados em números e dados, vale esperar pela definição dos diretórios fluminense, que conta com 84 mil filiados, goiano (71 mil) e do restante dos estados nordestinos (MA, PB, PE, PI, RN e SE – juntos, totalizando cerca de 155 mil filiados).
Alguns modelos preditivos têm sido divulgados por consultorias e analistas políticos, mas ao fim e ao cabo, essa promete ser uma disputa acirradíssima entre os tucanos, com muita água para passar por debaixo da ponte. No cenário de hoje, tanto Eduardo Leite quanto João Doria podem ser a cara do PSDB em 2022.