Política sem Aspas

Fernando Bezerra: uma decisão que pode esperar

Em mais uma semana morna entre política e o mercado, os corredores do Congresso sentiram a pesada presença dos agentes da Polícia Federal. O alvo, dessa vez, foi o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) e seu filho, deputado Fernando Coelho Filho (DEM-PE). A busca seria mais trivial se Bezerra, o pai, não fosse líder do governo no Senado e um dos principais articuladores políticos do Planalto na casa.

O inquérito da Polícia acirrou a tensão entre Senado – que vem discutindo uma possível CPI para investigar o Judiciário – e STF, cujo ministro que autorizou as buscas, Luís Roberto Barroso, faz parte. Mais do que isso, porém, desestabiliza a presença política do Executivo na casa. Neste artigo, quero analisar o importante papel histórico do MDB como “partido-pivô” de governos, os recentes escândalos de corrupção envolvendo o partido e a (ainda) baixa nocividade deste caso, envolvendo Fernando Bezerra.

De maneira breve: Bezerra e seu filho estão sendo investigados pela Polícia Federal, pela Operação Desintegração, por suposta ligação com irregularidades e propinas em obras públicas. Segundo a PF, os dois alvos teriam recebido cerca de R$ 5,5 milhões desviados de obras públicas, segundo delação do operador financeiro João Carlos Lyra.

Diante disso, o senador logo colocou o seu cargo de líder de governo à disposição, reforçando que a decisão estava nas mãos Bolsonaro, Onyx Lorenzoni (ministro da Casa-Civil) e Luiz Eduardo Ramos (ministro da Secretaria de Governo). Bezerra é um experiente articulador político e considerado peça-chave para o bom desempenho do governo no Senado. Juntamente com o presidente Davi Alcolumbre, vem articulando a reforma da Previdência e tributária, assim como tenta promover a aprovação de Eduardo Bolsonaro para a Embaixada dos EUA. Seu bom relacionamento com todos os senadores, inclusive oposição, é um ativo valiosíssimo.

No macro-político, o MDB é o partido com maior bancada no Senado (13), ocupando 16% do total das cadeiras. A sigla é uma das mais antigas do Brasil, tendo protagonizado o movimento das Diretas Já, o impeachment de Fernando Collor e de Dilma Rousseff. Sua tradição sempre foi governista – ou seja, o MDB raramente não formou coalizão com governos desde Collor, inclusive sendo conhecido como partido-pivô de coalizões, pelo seu tamanho – o que trouxe ao partido uma má reputação por conta de diversos escândalos de corrupção.

Da história brasileira, o MDB não herdou somente essa confusão do público e do privado. Resquícios do coronelismo também perpassam sua história. O partido sempre teve muita capilaridade em todo o Brasil, com grandes “famílias” ou caciques regionais que ditavam e dominavam a política nos âmbitos estaduais. Inclusive, uma das surpresas das eleições de 2018 foi a rejeição de grande parte deles pelo povo: Valdir Raupp (RO), Eunício Oliveira (CE), Edison Lobão (MA), Romero Jucá (RR), Roberto Requião (PR) e Garibaldi Alves (RN) são exemplos de caciques não eleitos. Claro, não nos esqueçamos do ilustre José Sarney.

Nesse ínterim, Bezerra não é o primeiro a ser investigado pela Polícia por possíveis ilicitudes. Na verdade, uma rápida pesquisa aponta que somente quatro dos 13 senadores não têm algum inquérito aberto. Dos outros nove, alguns até já respondem como acusados (fase seguinte à investigação da PF, em que o Ministério Público abre uma denúncia).

O alto número é reflexo de um partido contaminado pelo fisiologismo, sem identidade; essência e, consequentemente, rachado. Para dimensionar: a senadora Simone Tebet, presidente da CCJ e sem nenhuma investigação nas costas, fala em superação de uma “parte” atrasada do MDB. Prova disso foi sua candidatura à Presidência do Senado, no início do ano, contra seu colega partidário, Renan Calheiros (AL). Um movimento que representa a renovação interna dos emedebistas, contra a queimada “velha guarda”.

Agora, Bolsonaro precisa decidir se rifa Fernando Bezerra ou se o mantém no cargo. Por um lado, a decisão não deveria ser difícil dado o discurso anticorrupção do presidente e também da independência construída entre os poderes Executivo e Legislativo. Na outra ponta, não se sabe quão caro pode ser não ter o emedebista na articulação política. Quem o substituiria? Os senadores do PSL são inexperientes e não tem muito trânsito entre diferentes grupos. Com outros partidos, a necessidade de coalizão aumentaria. Romper com o MDB parece arriscado. Além disso, todo o trabalho de Bezerra à frente dos projetos urgentes seria descartado.

Uma decisão como essa não pode ser tomada às pressas. Sem sombra de dúvidas, muitas cabeças do governo devem estar projetando todos os riscos envolvidos nas diferentes saídas. Se o presidente estiver rodeado de uma equipe qualificada, tomará a melhor decisão: Bolsonaro pode se apegar à presunção de inocência, esperar os próximos passos da investigação e, no mínimo, aguardar uma eventual denúncia do Ministério Público. Afinal, investigações também existem no caso de Flávio, seu filho, mas nada é provado.

Não decidir sobre Fernando Bezerra é, ao cabo, também uma decisão.

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