Política sem Aspas, por Felipe Berenguer

Dois governos | Política sem Aspas

Na quarta-feira (23), o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pediu exoneração do cargo após muita pressão pela sua demissão, tanto por parte de outras alas do governo e da sociedade civil, mas principalmente a pedidos de deputados e senadores do Congresso Nacional.

Com a saída de Salles, o governo Bolsonaro chega à sua 16ª mudança no comando de pastas ministeriais – vale lembrar que são 23 ministérios na Esplanada, mas houve mais de uma troca em pastas específicas, como a Saúde e a Educação.

De qualquer forma, é nítido que, após dois anos e meio de mandato, a postura adotada em 2019 – referente ao fim do “toma lá, dá cá” e sobre a formação ministerial de nomes de confiança e proximidade do presidente – parece tão distante que quem acompanha de longe política diria que tal momento sequer existiu.

No limite, são dois governos distintos e um desfecho óbvio: Bolsonaro levou suas promessas de campanha até onde deu, mas foi, como previsto, engolido pelo sistema político brasileiro – e quem acreditou em mudança, agora finge que não vê um governo de coalizão com custos elevadíssimos ou escolhe outros fantasmas para desviar a atenção do fato de que é assim que o jogo é jogado em Brasília.

Entre as 16 demissões, temos vários motivos. Primeiro, contudo, vamos comentar a queda do advogado paulista do Ministério do Meio Ambiente (MMA). O agora ex-ministro já balançava no cargo desde investigações da Polícia Federal em endereços ligados a seu nome e a abertura de dois inquéritos criminais no Supremo Tribunal Federal (STF) – o primeiro tratando da suspeita de facilitação à exportação ilegal de madeira, aberto pelo ministro Alexandre de Moraes, e o segundo, aberto pela ministra Cármen Lúcia, decorrente de uma notícia-crime apresentada pelo delegado da PF, Alexandre Saraiva, acusando Salles de obstrução de justiça em apurações envolvendo apreensão de madeira.

Salles estava no governo desde o início do governo Bolsonaro e colecionou uma série de polêmicas no comando do MMA: flexibilização da legislação ambiental; fragilização do Ibama e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio);crise de incêndios no Pantanal; as falas mais fortes na polêmica reunião ministerial e as investigações envolvendo seu nome.

Apesar de ter a confiança máxima do presidente Bolsonaro, o chefe da pasta do Meio Ambiente não tinha bom trânsito com outras nações – nos EUA, Salles ganhou o apelido de “senhor motosserra”; com os europeus, quase não houve diálogo; e os chineses o colocaram no mesmo rol de outros desafetos, como o ex-ministro do Itamaraty, Ernesto Araújo.

Nos bastidores, interlocutores do governo sabiam que Salles sentia-se desgastado, mas não esperavam uma demissão precoce – no que dependesse do Planalto, inclusive, haveria demissão nenhuma. Há quem diga que a exoneração do ministro teve a ver com a polêmica que eclodiu no mesmo dia, acerca de irregularidades e superfaturamento no processo de aquisição de doses da vacina Covaxin, do laboratório indiano Barath Biotech.

Essa alternativa pararia em pé se não fosse a presença do deputado Luís Miranda (DEM-DF) da base aliada do governo – um dos pilares da denúncia do esquema de corrupção da vacina – na CPI da Covid já nesta sexta (25). Aliás, CPI esta que estava praticamente morta, mas agora volta aos holofotes da imprensa, de Brasília e do mercado graças aos novos rumores.

Seja como for, a saída de Salles tem peso simbólico – ou seja, não deve representar um giro de 180º na política ambiental do governo –, mas não deixa de ser relevante. O ex-ministro era frequentemente visto com Bolsonaro e representava um dos pilares do eleitorado mais fiel no governo. Ao mesmo tempo, contudo, seu substituto não deve promover mudanças radicais na atuação do MMA – parte do Congresso quer ver uma política ambiental diferente, mas a bancada ruralista elogiou o nome escolhido.

No lugar do ex-ministro, assume o secretário da Amazônia e Serviços Ambientais do MMA, Joaquim Álvaro Pereira Leite. O novo ministro foi conselheiro da Sociedade Rural Brasileira de 1996 a 2019 e tem excelente trânsito no agronegócio brasileiro.

Se olharmos para 2021, já havia ocorrido uma dança das cadeiras importante em meados de março, com o Centrão cobrando seu preço pelo apoio ao presidente. O general Fernando Azevedo e Silva foi exonerado do ministério da Defesa e o então ministro da Casa Civil, general Braga Netto, ocupou seu cargo.

Para a ex-pasta de Braga Netto, foi o general Luiz Eduardo Ramos, antes no comando da Secretaria de Governo – pasta responsável pela articulação política do Planalto na Câmara e no Senado Federal. Foi aí, então, que entrou em cena a indicação do Centrão: Flávia Arruda (PL-DF), nome de confiança do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ocupa a pasta até hoje.

Também tivemos a volta do André Mendonça, que havia sido alocado para o comando do ministério da Justiça, para a Advocacia-Geral da União, após a saída de José Levi. Atualmente, a cadeira que já chegou a ser ocupada, neste mesmo governo, pelo ex-juiz Sérgio Moro está sob comando do secretário de Segurança do Distrito Federal, Anderson Gustavo Torres, que tem bom trânsito entre legendas da base governista.

O episódio Sérgio Moro, no ano passado, foi um dos casos em que Bolsonaro demitiu (ou forçou a demissão) o ministro por divergências políticas. Nesse rol, temos também a saída precoce do falecido Gustavo Bebianno – o primeiro a ser demitido, em 18 de fevereiro de 2019 – por conta de supostos esquemas de laranjas no partido (PSL) em que Bolsonaro estava integrado, mas acabou deixando e também o caso do general Santos Cruz, que ocupava a Secretaria de Governo e entrou em rota de colisão com os filhos do presidente, ainda em 2019.

Outro segmento de demissões diz respeito à falta de entrega nas respectivas pastas e/ou pressão, vinda de fora, pela troca. Como já dissemos, é aí que entra Ricardo Salles, mas também o ministro Gustavo Canuto, substituído por Rogério Marinho – então secretário no ministério da Economia – no ministério do Desenvolvimento Regional, assim como o primeiro-ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, e seu substituto, Abraham Weintraub – o primeiro, demitido pela confusão envolvendo o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e o segundo pelas inúmeras polêmicas com outros Poderes. Por fim, destaca-se a saída do ministro Ernesto Araújo, que caiu por conta das intempéries na relação Brasil-China.

Fica faltando apenas o ministério da Saúde que, como sabemos, é um capítulo à parte. Com o advento da Covid-19, o governo federal promoveu três trocas na pasta – de Mandetta para Teich, passando para o general Pazuello e, por fim, mantendo o médico Marcelo Queiroga no comando (até o momento) – uma absoluto recorde mundial, que não merece nenhum destaque vide o contestado combate à pandemia promovido pelo governo.

Apesar de todas as mudanças e a notória “varrida” da ala ideológica por parte do governo, alguns nomes fortes, como o ministro da Economia, Paulo Guedes, a ministra da Família, Damares Alves, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, e o ministro Onyx Lorenzoni, atualmente na Secretária-geral da Presidência, continuam no governo.

Da mesma forma, o Planalto tem resistido ao aumento de ministérios para acomodar demandas de aliados políticos – lembrando que o enxugamento de pastas foi um dos primeiros atos do governo Bolsonaro. De olho em 2022, porém, resta saber quais serão os custos para o apoio no Legislativo e até mesmo na campanha de reeleição de Bolsonaro.

No mais, seguimos com a máxima – que não deve mudar nos próximos quatro, oito ou dez anos – de que não se governa sem apoio legislativo no Brasil. Lá atrás, levantei duas teses: ou Bolsonaro resistia à formação de coalizões para agradar sua base e cumprir com promessas de início de governo (essa tese, a mais provável), ou então o presidente iria se esfacelar em termos de apoio, ficando isolado e configurando nova paralisia política no País. Pois bem: nestas supostas duas faces de um só governo, já se sabia que a primeira delas seria insustentável.

Leia a minha última coluna para ficar por dentro do que movimenta Brasília: Centro órfão | Política sem Aspas.

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