É comum dizer que a vida está de “vento em popa” quando todas as atividades e objetivos vão confluindo e têm todas as circunstâncias favoráveis. A analogia vem da náutica e representa o alinhamento da direção do vento com a direção em que o barco está se deslocando.
Seguindo no linguajar da navegação, pode-se dizer que o Brasil, e o mundo também, vai saindo de uma forte tempestade – a pandemia de Covid-19 – e a ressaca do mar vai ficando para trás. Assim, voltando à normalidade, as atividades econômicas e políticas também encontram seus eixos naturalmente.
O atual governo, contudo, não tem encontrado os bons ventos necessários para deixar seu presidente, Jair Bolsonaro, em posição confortável para atingir seu objetivo: ser reeleito para mais um mandato presidencial no pleito de 2022. A última pesquisa da XP, em parceria com o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe), mais uma vez reportou números negativos para o Planalto e segue demonstrando que o vento está em proa – justamente na direção contrária à navegação.
A nova rodada mostrou continuidade na tendência de crescimento de avaliações negativas do governo, tanto pela impressão da população sobre a atuação do presidente e sua equipe, quanto pelo restante do mandato. A XP/Ipespe realizou 1.000 entrevistas telefônicas, de abrangência nacional e de acordo a estratificação da população brasileira por sexo, região, tipo de cidade, idade, nível educacional, ocupação, renda familiar e religião. A pesquisa foi realizada entre os dias 11 e 14 de agosto e tem margem de erro de 3,2 pontos percentuais.
O percentual dos entrevistados que consideram o governo Bolsonaro “Ruim ou Péssimo” atingiu sua máxima histórica, chegando na casa dos 54% – no mês de junho, a parcela era de 50%. Na mesma linha, as avaliações “Regular” e “Ótimo ou Bom” atingiram seus menores níveis desde o início do mandato, respectivamente em 23% e 20%.
Nas outras métricas de avaliação de governo, o mesmo fenômeno é observado: perguntados se aprovam ou desaprovam a maneira como o presidente vem administrando o Brasil 63% responderam que desaprovam a atual gestão, enquanto 29% aprovam e 8% não sabem ou não quiseram responder. Sobre as expectativas para o restante do mandato, 52% acreditam que o governo fará um trabalho “Ruim ou Péssimo”, 15% acreditam que ele será “Regular” e 28% enxergam um restante de mandato “Ótimo ou Bom” – os 5% restantes não responderam ou não têm opinião formada.
A avaliação negativa do governo vai subindo desde outubro de 2020 e era explicada principalmente pelos efeitos da pandemia de Covid-19 – em especial, a forte segunda onda que assolou o País.
No entanto, os atuais níveis de avaliação negativa têm mais a ver com outros aspectos do governo, que serão detalhados mais à frente. O maior deles, contudo, é a perda do poder de compra do brasileiro, resultado de uma inflação de aproximadamente 9% nos últimos 12 meses. Após alguns meses apresentando tendência de queda, as perspectivas para o futuro da economia brasileira voltaram a apresentar resultados mais pessimistas – ainda que a variação mais recente tenha ficado no limite da margem de erro.
Dos entrevistados, 63% acreditam que a economia está no caminho errado e apenas 27% acreditam que ela está no caminho certo. Antes da pandemia, no fim de 2019, a realidade era bastante diferente, com maioria confiante sobre o rumo da atividade produtiva do País.
Apesar da retomada da atividade econômica, com a retirada de praticamente todas as restrições de circulação, o brasileiro tem visto os preços de itens do dia a dia – especialmente, gasolina, botijão de gás e alimentos em geral – subirem de forma acelerada. Isso impacta diretamente nas preferências econômicas dos consumidores e, muitas vezes, corrói a renda do brasileiro. Tal conjuntura, aliada ao alto nível de desemprego do País, tende a minar a popularidade de qualquer líder.
Para piorar, alguns setores antes considerados aliados, hoje ensaiam distância do governo – é o caso de parte do mercado financeiro e dos militares, além de algumas siglas do Centrão. Nesse contexto, houve uma aposta do governo na radicalização do discurso, personificada em Bolsonaro e sua implicância com o voto impresso para 2022, de modo a reaquecer sua base mais fiel. No entanto, diante de quase 3 anos de mandato e alguns episódios de desgaste (sendo o maior deles, evidentemente, a gestão da Covid-19 no Brasil), a postura mais agressiva do presidente acaba por afastar ainda mais parte do eleitorado que votou nele em 2018, com receio de uma volta do PT ao poder. Entre a cruz e a espada, o Planalto não consegue calibrar o posicionamento do presidente para reverter a tendência de queda da avaliação de governo.
Faltando cerca de um ano e dois meses para as eleições, a ala política de Brasília terá de mudar sua estratégia para evitar um estrago maior – afinal, na política, o momentum também importa muito. Seja como for, o atual presidente está cada vez menos na posição de escolher um adversário para o segundo turno, como se ele já estivesse garantido. A pesquisa da XP, ainda que seja muito cedo para traçar cenários de segundo turno, mostra que todos as simulações entre Bolsonaro e outro candidato (seja ele Lula, Sérgio Moro, Ciro Gomes, Eduardo Leite, Luiz Henrique Mandetta ou João Doria) resultam em desvantagem para o atual presidente.
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