Política sem Aspas

A força das panelas e a chance de impeachment

Parecia um déjà-vu, mas não era. Na última quarta-feira à noite, a antítese: ruas silenciosas e prédios barulhentos. O vazio das vias deu lugar ao piscar de luzes de apartamentos nas principais capitais do país. Os consagrados panelaços voltaram. O tilintar que ajudou a derrubar Dilma mostrou que não tem ideologia, e a curiosa ressignificação dos utensílios de cozinha passou um recado direto a Bolsonaro.

O presidente, de tanto brincar com fogo, se queimou. Diante de uma ameaça séria e invisível, seu comportamento não esteve à altura do cargo. Fez questão de chamar, por repetidas vezes, a reação ao coronavírus de “histeria”. Faltou-lhe sobriedade para olhar, por exemplo, para o caos na Itália. Infelizmente, foi preciso constatar o falecimento de dois cidadãos para que o Planalto mudasse o tom. Como falam por aí: antes tarde do que nunca.

O aprendizado que o Executivo deve levar consigo quando o episódio passar é que com alguns temas não se pode ser negligente. Saúde pública é um deles. Historicamente, a população brasileira sempre cobrou governos sobre a situação da saúde no País.

No caso do coronavírus, em especial, o desafio é ainda maior. Sem ainda nenhum remédio ou vacina para combater a doença, o compromisso de autoridades públicas deve ser redobrado. Somente assim conseguiremos uma mobilização em massa contra o vírus – e, segundo o gráfico acima (disponibilizado pelo site Terraço Econômico), já estamos atrasados. Com a exceção da China, o Brasil tem a curva mais acentuada de número de casos desde o primeiro dia em que se confirmou pelo menos um infectado.

Não restam dúvidas de que o governo federal não tratou, de fato, a crise como crise desde o início. Nesse sentido, Bolsonaro corre o sério risco de ser culpabilizado caso a situação do Brasil saía drasticamente de controle. O panelaço foi um misto de espontaneidade, indignação e desespero. Como assim o presidente do País subestima o coronavírus?

Junto das panelas, vieram os burburinhos de impeachment – nas redes sociais e, reservadamente, nos corredores do Congresso. No curto e médio prazo, ele – o impeachment – não deve acontecer.

Ainda que alguns elementos para o desastre – ausência de coalizão, manifestações contrárias, racha no partido e isolamento de grupos políticos – estejam já presentes, há alguns fortes obstáculos para a queda do presidente.

O primeiro deles é sua popularidade. Com panelas ou sem panelas, Bolsonaro ainda tem cerca de ⅓ de aprovação entre os brasileiros. Com um olho nas próximas pesquisas, há de se admitir que o número é demasiadamente alto para um impeachment. Basta olhar os índices de Dilma e Collor à época da abertura de seus respectivos processos.

Em segundo lugar, o processo de destituição de um presidente é bastante traumático para as instituições. De acordo com o constitucionalista Oscar Vilhena Vieira, o mecanismo de impeachment existe essencialmente para: a) evitar abuso de poder do presidente; b) desincentivar golpes e atentados da oposição contra o chefe do Executivo; e c) corresponsabilizar a sociedade e o Poder Legislativo pela definição dos padrões legais e éticos do exercício presidencial. Levando em consideração o terceiro motivo, parece que sociedade e Legislativo ainda não vêm mais bônus do que ônus em um processo de impeachment nas atuais circunstâncias. Afinal, o julgamento vem acompanhado de acirramento político, radicalização e jogo duro constitucional.

Logo, a decisão de levar adiante o impedimento tende a ser a última das opções e é motivada por paralisia política e/ou grave crise – ambas geralmente criadas pelo governo.

Por fim, há de se destacar a importância do presidente da Câmara no processo. É ele o responsável por aceitar o pedido de impeachment e colocá-lo em votação. Sem sua anuência, o mecanismo não prossegue. Nesse caso, o atual presidente, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já sinalizou algumas vezes que não vê tal possibilidade como uma saída no momento atual. Em caso de dúvidas, é só comparar as atitudes de Maia com as do ex-deputado Eduardo Cunha.

Desse modo, o presidente da Câmara parece focado em superar a crise do coronavírus e conter, na medida do necessário, as escorregadas do Planalto. Em 2019 e 2020, diversos desentendimentos entre os Poderes foram superados por meio dessa postura.

As panelas, porém, deram o recado. Ninguém senta na cadeira da Presidência e se torna intocável. A conjuntura pede seriedade. As forças políticas trabalham para enfrentar os impactos do coronavírus. Em governos fragilizados, ser displicente pode ser duplamente fatal: por despertar a indignação do povo e por fazer com que as mudanças dos ventos políticos sejam difíceis de serem vistas.

Um abraço,

Felipe Berenguer
[email protected].br

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