Política sem Aspas, por Felipe Berenguer

A armadilha da popularidade

Na coluna de hoje, vou trazer a nova rodada de pesquisas sobre o governo Bolsonaro, assim como seus impactos sobre a tomada de decisão do presidente acerca dos rumos a serem seguidos nestes dois anos restantes de mandato.

Para isso, usufruí de informações dos seguintes levantamentos – todos divulgados em agosto: a) as Pesquisas Datafolha sobre Avaliação do presidente e o Auxílio Emergencial, feitas, por telefone, com 2.065 brasileiros adultos, em todas as regiões e Estados do País; b) a Pesquisa XP/Ipespe de Política Nacional, coletada por também meio de 1.000 entrevistas telefônicas abrangendo todo o território nacional, de forma estratificada; e c) a pesquisa do PoderData/Grupo Bandeirantes, feita por meio de ligações para celulares e telefones fixos, com alcance de 2.500 entrevistas em 481 municípios de todas as unidades da Federação. Os períodos de coleta dos levantamentos foram, respectivamente, 11 e 12 de agosto, 13 a 15 de agosto e 17 a 19 de agosto (deste ano).

Em todos os levantamentos, foi possível observar a consolidação do aumento da popularidade do presidente. A tendência já vinha sendo apontada em pesquisas de avaliação em julho, dando fim ao processo de queda na popularidade de Bolsonaro, em meio ao advento da pandemia – meados de março em diante.

O PoderData indicou uma alta de 6 pontos percentuais (de 32% para 38%) na avaliação “Ótimo/Bom” de Bolsonaro, enquanto os que avaliaram seu trabalho como “Ruim/Péssimo” caíram de 41% para 35%. Dos entrevistados, 23% avaliaram o presidente como “Regular” e 4% não souberam ou não quiseram responder. O mesmo fenômeno pôde ser observado nas pesquisas da XP/Ipespe e do Datafolha. Nelas, a avaliação do presidente como “Ótimo/Bom” cresceu, respectivamente, de 30% para 37% e de 32% para 37%. No gráfico abaixo, é possível ver o compilado de evolução das pesquisas desde o início da pandemia, com ênfase na queda da avaliação negativa e no consequente aumento da avaliação positiva:

Ainda, o Datafolha disponibilizou o comparativo com outros presidentes desde o governo Collor, quando o Instituto iniciou a cobertura recorrente de pesquisas de avaliação. Como é possível observar na tabela abaixo, o desempenho de Bolsonaro somente é pior que o governo Lula II e Dilma I. Se comparado aos primeiros governos de FHC e Lula, Bolsonaro tem a maior avaliação “Ótimo/Bom” (37%), mas também carrega uma grande distância na avaliação “Ruim/Péssimo” (34%, contra 25% de FHC I e 17% de Lula I). Isso reforça o diagnóstico inicial de que o mandato do atual presidente teria uma polarização mais radical.

Ao efetuar um recorte de renda sobre o aumento da popularidade, nas três pesquisas é possível constatar a melhora de avaliação do governo nos estratos mais baixos da população, que concentram os beneficiários do auxílio emergencial. No levantamento da XP/Ipespe, a aprovação do presidente entre a população com renda de até 2 salários-mínimos passou de 28% para 34% e a aprovação entre os que têm renda de 2 a 5 salários-mínimos passou de 32% para 44%. O mesmo fenômeno é apontado na pesquisa do PoderData: entre aqueles sem renda fixa, a avaliação positiva saltou de 34% para 46%; entre a parcela com renda de até 2 salários-mínimos, a avaliação positiva saiu de 19% para 27%; entre a população de 2 e 5 salários-mínimos de renda, a avaliação foi de 37% para 39% (dentro da margem de erro). Já o Datafolha ressalta que a avaliação positiva do governo melhorou em todos os segmentos socioeconômicos, com destaque para a forte queda na reprovação entre os mais pobres (até 2 S.M.), de 44% para 31%.

As três pesquisas também apontam para uma melhora, mais residual, da avaliação do governo nas regiões Norte e Nordeste, regiões com maior presença proporcional de beneficiários do auxílio emergencial. Segundo dados do governo, a região Nordeste recebeu um terço dos R$ 121 bilhões repassados, até julho, à população. A região Norte, que representa 8,7% da população brasileira, recebeu, por sua vez, cerca de 10% do valor total pago até agora. No geral, porém, o recorte mais importante para entendermos a melhora da popularidade de Bolsonaro é socioeconômico. O impacto de um colchão de segurança, em tempos de crise, de 600 reais sobre uma população pobre não pode ser desprezado, inclusive tendo já sido receita de sucesso eleitoral – sob outras formas – nos governos petistas.

Contribui também para o melhor momento do governo a postura mais moderada do presidente desde meados de junho, quando o Brasil passava por um momento crítico no enfrentamento da Covid-19. De natureza mais combativa, a personalidade de Bolsonaro – principalmente por meio de suas declarações polêmicas – era fortemente criticada pela população. Da mesma forma, a difusão da culpa sobre as mortes da pandemia, antes concentrada na figura do presidente devido à minimização do coronavírus, auxilia na volta de uma popularidade mais alta conferida ao presidente. Captada pelas últimas pesquisas de avaliação, a suposta responsabilidade pelas mortes hoje é atribuída a grande parte dos atores políticos.

Sob uma perspectiva mais distante, é tentador para o presidente abraçar um projeto mais assistencialista (e menos austero) para pivotar sua reeleição em 2022. Caminhamos já para a metade do mandato; e, após um primeiro ano de governo fortemente calcado na ideologia e sem nenhum tipo de coalizão, a realidade deste segundo ano de mandato já é bastante diferente. Tendo de lidar com o pragmatismo político – normal em qualquer democracia –, o presidente recorreu ao Centrão e buscou amenizar os ataques aos outros Poderes, acomodando-se no tradicional jogo político.

O mercado, assim como a equipe econômica, espera por um governo liberal e reformista. Indicações – tanto do presidente quanto das práticas de políticas públicas – são de que ainda predomina o viés liberal: apesar de querer levar adiante o Renda Brasil e outros gastos, Bolsonaro prefere esperar que Paulo Guedes e sua equipe montem um plano para remanejá-los nas contas públicas, sem criar novas despesas. A tentação, contudo, de “comprar” a reeleição, impulsionada pelo aumento da popularidade, é grande. Na verdade, não só grande, como também usada inúmeras vezes na história da América Latina e seu eterno namoro com líderes populistas.

O presidente sempre insiste que questões econômicas são com o “Posto Ipiranga” e que PG tem total autonomia. No entanto, ele não está disposto a abrir mão, por exemplo, do abono salarial para bancar o Renda Brasil. Após vetar a proposta enviada pelo ministério da Economia, Bolsonaro mandou um recado: “O reformismo encontra seu limite na minha popularidade”. Aliás, verdade seja dita: em um ano e oito meses, todas as reformas feitas e/ou ensaiadas não têm nada de popular. Seria, agora, o presidente e suas pretensões eleitorais o empecilho para o andamento de reformas?

Um abraço,

Felipe Berenguer
[email protected].br

O conteúdo foi útil para você? Compartilhe!

Recomendado para você

O investidor na sala de espera

Salas de espera podem ser muito relaxantes ou extremamente desconfortáveis. Pessoas ansiosas consideram aquele período de inatividade quase uma tortura. Quem precisa de um tempinho

Read More »

Ajudamos você a investir melhor, de forma simples​

Inscreva-se para receber as principais notícias do mercado financeiro pela manhã.