Muito se fala de agosto como um mês difícil, mas desta vez setembro não deixou nada a desejar. Tivemos de tudo. Crise política chegando ao extremo nas manifestações de 7 de setembro, com risco de ruptura entre os Poderes, e até paralisação política dos caminhoneiros. Na sequência, o recuo do presidente, com a nota mais pacificadora elaborada junto ao ex-presidente Temer, e entrevistas em que falou em não dar golpe, não “melar” as eleições de 2020, fazendo, inclusive, elogios às mudanças que o TSE tem feito nas estratégias de controle e de fiscalização das urnas eletrônicas.
Na economia, avanço da inflação e dos juros, crises hídrica e de energia, com adoção da bandeira de escassez hídrica (no lugar da vermelha de nível dois), aumento das incertezas fiscais com a intenção do governo de turbinar o Bolsa Família sob o nome de Auxílio Brasil. Nenhuma crítica ao programa em si, necessário diante do aumento da pobreza decorrente da pandemia, mas com muitas dúvidas quanto à forma como se pretende gerenciar todas as regras fiscais envolvidas, desde a Lei de Responsabilidade Fiscal, passando pela de Diretrizes Orçamentárias, até o teto de gastos. O governo aumentou o IOF, encarecendo mais as operações de crédito, para bancar o lançamento do novo programa ainda neste ano, só que contando, a partir de 2022, com a receita extra que pode vir da Reforma do Imposto de Renda, por meio da taxação de Lucros e Dividendos. Reforma que ainda pode passar por grandes mudanças no Senado.
O relator e senador Angelo Coronel fala em ouvir todas as partes envolvidas, para entender os motivos e os efeitos de cada uma das propostas incluídas no projeto. Ademais, ele já antecipa a intenção de ampliar a faixa de isenção das pessoas físicas para R$ 5 mil. Ou seja, o governo pode não ter o reforço de caixa esperado. Mesmo assim, está tendo aval para ampliar despesas permanentes relacionadas ao Auxílio Brasil com a proposta ainda em tramitação. Por outro lado, para que o Auxílio Brasil caiba no teto de gastos, há necessidade de postergação de boa parte dos Precatórios, de sentença judiciais, que deveriam ser pagos no próximo ano. Todas as saídas em discussão não trazem segurança quanto ao compromisso com o fiscal.
Mas os problemas não são apenas domésticos. Do lado externo pesam as incertezas quanto à inflação, hoje um problema global, as implicações sobre as políticas dos governos e bancos centrais, com boa possibilidade de o Federal Reserve, nos Estados Unidos, já começar a cortar os estímulos em novembro. Essa situação tem provocado mais pressão de alta sobre o dólar e as taxas dos treasuries, ampliando a volatilidade dos mercados.
Setembro foi um mês de ondas de aversão ao risco. Em outro sentido, há risco de uma crise também de amplitude global na área energética, com o aumento dos preços do petróleo e do gás, que afeta muito a Europa (com possível escassez no inverno, período de maior demanda). E, ainda, há a China no radar das preocupações. De lá veio uma das grandes pressões do mês, que foi a possível quebra da Evergrande, gigante do ramo imobiliário, que fez o mercado recordar a crise de 2008. Mas o país também enfrenta dificuldades com a menor oferta de carvão e de energia, que já prejudica a atividades das empresas e leva a uma revisão do potencial de expansão da economia.
Em meio a tudo isso, ainda temos a variante Delta como mais um fator de incerteza, especialmente pela nova onda de contágio e mortes registrada nos Estados Unidos.
Com todo esse cenário conturbado, dados domésticos mais favoráveis acabaram ficando em segundo plano. Poderíamos estar comemorando a melhora das contas públicas, com os recordes de arrecadação, favorecida até pela inflação mais alta, além da retomada da atividade, que permitiu a redução das projeções de déficit para este ano, com queda da relação dívida/PIB. Também temos a recuperação do mercado, nos números do Caged e da PNAD. Embora o desemprego ainda atinja mais de 14 milhões de brasileiros, com a taxa de desocupação do IBGE em 13,7% no trimestre encerrado em julho, houve uma melhora, reforçada pela flexibilização das atividades, diante de um controle maior da pandemia. O País tem conseguido avançar com a vacinação, o que pode nos garantir uma situação de menor risco, inclusive, em relação à variante Delta. Pelo menos, é o que se vê até agora.
O problema é que, paralelamente a tudo isso, estamos acompanhando uma revisão para cima das projeções de inflação e de juros, com a Selic podendo chegar à faixa de 9% no ano que vem. O que tem colaborado para a expectativa de um avanço menor da economia no próximo ano. As projeções, na média, estão em torno de 1,5%, mas muitos analistas já esperam crescimento abaixo de 1%, considerando também as implicações negativas de um ano de eleições que promete muita polarização e movimentos defensivos, até com adiamento de planos de investimentos. São problemas que deixam o cenário mais nublado.
Por mais que o Brasil esteja avançando com a agenda de Reformas e regulamentações que podem melhorar o ambiente de negócios, além de estimular investimentos e uma maior atratividade de capital, ainda esbarramos nos vários fatores de risco, ampliados pelas incertezas externas, que sempre são mais desfavoráveis para os países com mais pontos de vulnerabilidade. Potencialmente, poderíamos estar numa situação bem melhor. Mas qualquer avaliação de cenário e definição de estratégias de investimento tem de considerar essas questões desfavoráveis que citei e que podem pesar, também, nos próximos meses. A inflação ainda é um desafio. Juros mais altos atrapalham o crescimento. Muitas Reformas podem não ter a qualidade esperada. Interesses políticos ampliam os riscos no lado fiscal e até no institucional, apesar das tentativas de maior entendimento entre os Poderes. E não se pode prever com maior segurança até onde vai a crise energética. Que outubro venha com mais chuvas e menos problemas.
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