Temos de destaque na área econômica não ações efetivas, projetos, medidas, mas a queda de braço entre Lula e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Parece ser o bode expiatório para explicar prováveis dificuldades para retomada do crescimento econômico. Isso por conta da manutenção do atual nível da Selic, que Lula considera absurdo. Na verdade, os juros até são um dos fatores da expectativa de desempenho mais fraco da economia neste ano. O recuo da vendas do comércio de 2,6% em dezembro já é relacionada a isso, além do endividamento e a inadimplência elevada das famílias.
O problema é que os juros estão altos e devem continuar assim, por um bom tempo. A inflação ainda mostra uma certa resiliência. O IPCA em janeiro subiu 0,53%, abaixo do previsto e da variação de dezembro, que foi de 0,62%. Só que o acumulado em 12 meses está em 5,77%, bem acima da meta e as projeções do mercado para a variação no ano. Projeções que no relatório Focus, sobem há oito semanas, já se aproximando dos 6%.
A questão é que nessas projeções têm pesado muito as incertezas em relação à política econômica do governo. Começa com os estímulos através de programas, como o Bolsa Família, que injetam dinheiro na economia e podem gerar mais pressões de preços do que impactar a atividade. Depois, os aumentos de gastos geram dúvidas quanto à evolução das finanças públicas. E ainda tem a demora na definição do novo arcabouço fiscal, de novas regras que devem substituir o teto de gastos. São questões que afetam muito as expectativas para a inflação.
Na ata da última reunião do Copom até se destacou o impacto positivo, nas expectativas, do pacote anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para aumento das receitas, mesmo com as dificuldades de execução. Foi um voto de confiança no governo, na preocupação em melhorar o saldo das contas, bem recebida por Haddad, que até elogiou a ata. Mostrou que o Comitê e Roberto Campos Neto tentam um diálogo.
Só que isso não aliviou as críticas de Lula e apoiadores. Postura que gera preocupações quanto à possível elevação das metas da inflação, a serem definidas pelo Conselho Monetário Nacional, e alguma iniciativa para acabar com a autonomia do Banco Central.
É um discurso que tem apelo, já que os juros elevados incomodam, atrapalham planos de consumidores e empresas, a atividade econômica. Porém, não se pode perder de vista que o Banco Central vem cumprindo a tarefa dele, que é derrubar a inflação para as metas, sozinho. Isso desde o governo anterior, que esteve muito focado em busca de apoio político e popular, atuando para derrubar preços, através do corte de tributos, apenas para evitar queda de popularidade. Na época os vilões foram os dirigentes da Petrobras.
Se o governo mostrar serviço com ações que tragam mais clareza quanto ao que pretende fazer em relação às finanças públicas, em vez de causar ruídos desnecessários, até quando fala da necessidade de responsabilidade social além da fiscal, poderia ajudar a acomodar as expectativas tanto para a inflação quanto às condições e prazo para que possa haver cortes dos juros. Até por aí as projeções têm piorado.
A sinalização é que teremos de esperar até abril para o anúncio do novo arcabouço fiscal. Até lá é possível que ainda tenhamos muita volatilidade dos mercados por declarações que reforçam incertezas. Isso após vários momentos de trégua em que, inclusive pela entrada de capital externo, a Bolsa engatou recuperação mais firme e o dólar testou piso abaixo dos R$ 5,00.
Enquanto se reclama da Selic, a curva de juros vai aumentando o custo da dívida pública, garantindo maiores ganhos para os investidores, além de elevar o custo do crédito, mais do que deveria subir pela influência da manutenção dos juros básicos no atual patamar.