A retração do PIB já era esperada no último trimestre do ano passado, diante de dados setoriais mais fracos e perda de ritmo até da geração de empregos. Os juros passaram a pesar mais, com inadimplência em alta, afetando o consumo, junto com o elevado custo de vida. A contração das importações, no fechamento do ano, também refletiu a desaceleração da atividade, assim como a queda da formação bruta de capital fixo. As exportações cresceram e junto com a forte expansão dos Serviços, incluindo atividades turísticas, no embalo da reabertura pós Covid, foram os destaques mais favoráveis.
Além da retração de 0,2% do PIB no quarto trimestre, houve revisão de 0,4 para 0,3% da expansão do terceiro, quando a economia começou a indicar a perda de fôlego. Não por coincidência, foi o período em que o governo anterior se preocupou em dar estímulos adicionais, como o reforço do auxílio emergencial e a redução de preços, através do corte de tributos, como combustíveis, para amenizar a inflação, dando alguma sustentação ao consumo. Fato é que isso não impediu a perda de ritmo da economia e o PIB de 2022, com expansão de 1,9% no quarto trimestre sobre o mesmo período de 2021 e de 2,9% no ano, reduziu o carregamento estatístico previsto para 2023, que caiu para apenas 0,2%. Fora isso, outros fatores colaboram para a perspectiva de avanço em 2023 de, no máximo, 1%, nas projeções mais otimistas. A média do Focus na última semana estava em 0,84%. Entre os fatores que devem limitar a expansão tem a menor geração de emprego, inflação ainda alta, juros elevados, até por indefinições na área fiscal, aumento da inadimplência, com mais restrições do crédito, inclusive para as empresas, pelo efeito do caso Americanas, e alta dos juros no exterior, com menor crescimento das economias desenvolvidas.
Do lado favorável ao crescimento tem o aumento da massa de rendimentos, diante do desemprego menor, os programas de transferência de renda, como Bolsa Família, a esperada correção do mínimo com ampliação da faixa de isenção do IR, a provável retomada da China, que deve fortalecer as exportações de commodities e a safra recorde que pode garantir um avanço do PIB Agropecuário entre 7 e 8%. Só que para melhorar as perspectivas o governo terá de correr com algumas correções de rotas relevantes. Uma delas é a fiscal.
O pacote para aumento de receita anunciado recentemente, a reoneração dos combustíveis decidida nesta semana e a promessa de anúncio do arcabouço fiscal este mês vão no sentido correto, mas ainda não são suficientes para garantir efetivo ajuste das contas públicas, principalmente pela PEC da transição aprovada no início do novo governo, que deu margem para ampliação de gastos, sem entrar no mérito do quanto são necessários, levando à projeção do déficit de R$ 231,5 bilhões este ano, sem considerar o pagamento dos juros da dívida pública. Reverter esse quadro, talvez para o déficit aí em redor de 1% do PIB, como antecipou o ministro Haddad pode marcar pontos importantes em termos de credibilidade, cenário para corte dos juros e estímulo aos investimentos produtivos.
Em termos de perspectivas, ainda é importante o avanço de reformas, como a tributária, e de políticas que possam estabelecer as bases para uma retomada sustentável, de longo prazo, da economia. A indústria, como mostrou o PIB, continua patinando, o comércio depende da recuperação da renda, do emprego, de inflação e juros mais baixos, com reversão da inadimplência, que tem levado a um crédito ainda mais caro e restritivo. A economia brasileira precisa de alavancas de crescimento que não devem depender tanto de medidas de estímulo do governo. Até para que o governo tenha condições de se redimensionar, facilitando o ajuste fiscal. Fora questões estruturais, ainda tem as incertezas relacionadas às políticas a serem implementadas nas várias áreas, como na Petrobras, estatais em geral, BNDES.
Como já ressaltei em outras ocasiões, o novo governo trouxe expectativas positivas para as relações exteriores, meio ambiente, saúde, educação, cultura, direitos humanos. Mas faltam diretrizes básicas na economia e é preciso abafar os ruídos que trazem mais incertezas e instabilidade para o mercado, como em relação à política de juros do Banco Central, metas inflacionárias, preços dos combustíveis. Sendo que o mercado já vem mais instável por influência externa, com o receio de alta mais forte dos juros, entre outros fatores.
A divulgação do PIB e de outros indicadores na semana ampliam as reflexões quanto ao cenário para 2023. Passado o Carnaval, é hora de o ano começar pra valer. Embora o novo governo nem tenha tido os tradicionais cem dias de lua de mel. Mesmo sem contratempos com o Congresso, que aprovou a PEC da transição e reelegeu os presidentes da Câmara e do Senado, ocorreram os atentados de 8 de janeiro, as investigações e negociações institucionais, a reestruturação das várias áreas, retomada de contatos externos, crise dos yanomamis, tragédias ambientais e com toda essa complicada agenda a ser definida para colocar a economia nos eixos.
Para os empreendedores fica a recomendação de cautela, planos bem estruturados, controle das dívidas e da dependência do crédito, com avaliação cuidadosa e até um pouco conservadora do próprio ramo de atividade. Mesmo setores com melhor performance têm suas desigualdades, assim como não temos setores 100% ruins. Já os investidores ainda têm boas opções relacionadas aos juros elevados, mas devem aproveitar oportunidades em outros segmentos, através de uma garimpagem criteriosa e bem orientada. Certo é que estamos numa fase em que não se pode contar com monotonia e tendências mais definidas.