A política de juros tem sido um desafio global em meio às dificuldades que muitas economias ainda enfrentam para consolidar o processo de retomada, após o tombo provocado pela pandemia, além de outros fatores.
Esta semana foi marcada por várias decisões dos bancos centrais, inclusive no Brasil. Por aqui, a sinalização de manutenção do ritmo de um ponto nos ajustes da Selic, agora em 6,25% ao ano, demonstra uma certa cautela do BC. Embora a prioridade seja o controle da inflação, há uma certa preocupação em não pisar muito fundo no acelerador dos juros, provocando mais impacto no ritmo de atividade, que já demonstra perda de fôlego, com a piora mais acentuada das projeções para o PIB de 2022.
O comunicado do Copom deu a entender que não haverá resposta imediata a índices que superem as expectativas, como tem acontecido, mas a uma observação da evolução do cenário, mesmo com as projeções de inflação para o ano que vem superando o centro da meta. Nada impede uma correção da dosagem do ajuste, se houver piora mais acentuada das perspectivas inflacionárias. Mas, por enquanto, o recado do BC é de cautela na elevação da taxa básica. Cautela meio relativa, já que podemos continuar com ajustes de um ponto a cada reunião recorrentemente – lembremos: há poucos meses, a Selic testava a faixa dos 2% ao ano.
Além do Copom, o Federal Reserve também mexeu com as expectativas do mercado. A taxa foi mantida em 0,25%, mas houve indicação de possível início do corte dos estímulos já em novembro, independentemente dos próximos dados do mercado de trabalho. Até houve leituras diferentes quanto a essa possibilidade, pois o recado mais duro veio da entrevista de Jerome Powell, presidente do FED. Mas já se sabe que boa parte dos dirigentes que definem a política está favorável até à elevação dos juros em 2022. O corte da injeção de recursos seria o primeiro passo. Não houve maior reflexo dessa indicação porque o mercado espera um certo gradualismo nos cortes, até porque a economia americana ainda convive com incertezas quanto ao ritmo de expansão, e persiste a avaliação de que a inflação é um problema passageiro. Nessa reação mais favorável do mercado ainda é preciso incluir o alívio depois da antecipação de um desastre com a Evergrande.
Enfim, o que devemos ver é o mercado continuar tentando antecipar os movimentos de política monetária, respondendo, ao mesmo tempo, a vários indicadores, não apenas aos de inflação. No Brasil, todas as pautas relacionadas às contas públicas estão sendo observadas com muita atenção, pelas implicações que possam ter até para a credibilidade do País. Há uma negociação em andamento para viabilizar a redução do compromisso do governo com o pagamento dos precatórios no ano que vem. Busca-se uma alternativa que não caracterize desrespeito ao teto de gastos, mas abrindo espaço para a ampliação do Bolsa Família, garantida, neste final de ano, pela taxação maior do IOF. No que se refere à Receita, para o ano que vem, o governo ainda conta com a aprovação da Reforma do Imposto de Renda, onde a taxação dos Lucros e Dividendos poderá, a princípio, compensar o compromisso maior, do lado das despesas, com o programa social. Apesar de alguns cálculos apontarem para o risco de perda de arrecadação com todas as mudanças implementadas na proposta original da Reforma, que foi encaminhada pelo Ministério da Economia.
Nas negociações com o Congresso ainda está um possível apoio de Guedes à PEC 110, em tramitação no Senado. Todas essas pautas ainda trazem incertezas quanto à questão fiscal e o real compromisso com o ajuste das contas, apesar de a evolução neste ano estar mais bem prevista. Com várias frentes de reforço da Receita, o Ministério da Economia já conseguiu até reduzir as projeções para o rombo das contas em 2021.
Em meio a tudo isso, ainda estão no foco do mercado a crise energética, o avanço de outras pautas, como a Reforma Administrativa e as privatizações e concessões, além do cenário político, que embute o risco de maior polarização quanto mais perto estivermos das eleições. E as estratégias em busca de maior base de apoio e mais popularidade podem interferir muito na gestão das finanças e em outras frentes de atuação.
Potencialmente, o mercado até pode ter uma evolução mais favorável. Pelo diferencial de juros, o País deveria ter um fluxo bem maior de recursos, acomodando o dólar em patamar mais baixo, o que ajudaria bastante no controle da inflação. Por outro lado, a Bolsa oferece excelentes oportunidades, principalmente com a flexibilização das atividades, diante de números melhores da pandemia. Mas os ruídos políticos e as indefinições da pauta econômica, especialmente na questão fiscal, ainda são motivo de cautela e um forte fator de instabilidade.
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Leia a última coluna da Denise Campos de Toledo: Expectativas incertas quanto aos ajustes da Selic.