Denise Campos de Toledo EECI

Mercado convive com aumento do grau de incertezas

O mercado continua convivendo e refletindo informações que tem aumentado muito o grau de incertezas. Começa com o exterior e as dúvidas quanto à inflação, política de juros, especialmente nos Estados Unidos, e o risco de recessão global, com destaque para a Europa, onde há o temor do corte de fornecimento de gás pela Rússia, o que traria mais pressões inflacionárias, com fortes reflexos sobre a atividade. Cenário que levou o euro a ficar abaixo da paridade com o dólar pela primeira vez em 20 anos.
Voltando aos Estados Unidos, a semana foi de confirmação da inflação muito pressionada, renovando recordes dos últimos 40 anos e reforçando a tendência de mais aumento dos juros, o que torna mais atraentes os títulos do País e o refúgio no dólar. O CPI, do varejo, subiu 1,3% em junho, com variação de 9,1% em 12 meses. O PPI, do atacado, avançou acima das projeções para junho em 1,1% no índice cheio e 0,4% no núcleo, com 11,3% e 8,2%, respectivamente, em 12 meses. Ainda que se conte com alguma desaceleração pela recente queda de preços de commodities, a expectativa dominante é de aumento de 0,75 nas taxas na próxima reunião do FOMC, com apostas de até 1 ponto. Todo esse cenário sustenta movimentos de aversão ao risco, com reflexos nos vários mercados, inclusive o local, mesmo que, pontualmente, tenhamos dias de trégua, até para correção de exageros.
Falando em riscos, apesar do discurso oficial de que os gastos extrateto do pacote de bondades ou PEC kamikaze ficarão restritos a este ano, a percepção do risco fiscal aumentou muito. O governo pode entregar as contas deste ano melhores do que se esperava, mas o teto de gastos foi driblado mais de uma vez, o estado de emergência aumenta o espaço para mais despesas eleitoreiras, e o orçamento secreto com emendas do relator está incluído na LDO de 2023. Mesmo que tenham retirado a obrigatoriedade da liberação de recursos, está institucionalizada uma nova forma do toma lá dá cá, para assegurar apoio político e agrados à base eleitoral. Risco que tem implicações na curva de juros, nas taxas dos títulos públicos, também influenciadas pela perspectiva de inflação ainda elevada no próximo ano, ameaçando o teto de gastos.
A retomada da divulgação do Focus confirmou a melhora das expectativas do mercado para este ano em termos de inflação e crescimento. O governo até elevou a projeção do PIB para 2%, apesar de o IBCBr ter apontado variações negativas nos últimos meses. Mas vários setores, como Serviços, seguem em embalo bem favorável, junto com a recuperação do emprego. A expansão de até 2% é bem possível até pela injeção de recursos com a aprovação da PEC. Só que continuam piorando as projeções, também de inflação e expansão, para 2023, o que aumenta a possibilidade de o Banco Central ter de manter juros mais altos por mais tempo.
A inflação deve mostrar uma desaceleração importante agora. Julho pode ter deflação, com o impacto do corte dos tributos barateando os combustíveis, recuo de energia, e desaceleração dos alimentos, com boas safras. Porém, a inflação anual ainda vai continuar acima do teto e vários fatores podem pesar no horizonte daqui para 2023. Exemplos: mais dinheiro em circulação reforça a demanda com implicações na formação dos preços, o dólar mais alto, por todo o cenário de incertezas, pode trazer pressões adicionais na inflação, e a reversão de desonerações, como de PIS/Cofins, pode fazer preços, como dos combustíveis, voltarem a subir. Daí a piora das previsões do IPCA do próximo ano.
Enfim, temos um cenário dos mais desafiadores, no qual devemos agregar o ambiente político e riscos institucionais, relacionados as eleições, que serão das mais polarizadas, com as desconfianças plantadas, sem fundamento, em relação à segurança das urnas e apuração dos votos, com sucessivos casos de violência já sendo registrados.
Precaução e maior busca por segurança na renda fixa parece ser o mais recomendável para os investidores, embora ainda possam aproveitar boas oportunidades que surgem em outros ativos, como ações, no caso de se contar com um horizonte maior. E, mesmo na renda fixa, é preciso considerar as mudanças de expectativas em relação à inflação e os juros. Por enquanto, não se pode prever qual será encaminhamento da política econômica no Brasil nem se haverá a confirmação da recessão global, num ambiente de juros mais elevados. Vale ressaltar ainda os impactos sociais e políticos que a alta da inflação, com aumento da pobreza, vêm tendo em vários países, o que pode ter implicações sobre os governos e e a gestão das economias.

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