O mundo encara as consequências da pandemia e da guerra da Rússia contra a Ucrânia, em que, independentemente das sanções, Putin tem conseguido se impor no jogo de forças até do ponto de vista econômico, com possível corte maior de gás reforçando a sombra de uma recessão para a zona do euro. Sendo que a necessidade de alta dos juros, para conter índices recordes de inflação, também tem colocado a retração de atividade no radar, o que vale, inclusive, para os Estados Unidos.
Paralelamente aos problemas econômicos, vêm as dificuldades políticas, com as cobranças da sociedade por uma melhora na condição de vida. A inflação elevada cria um ambiente desfavorável nos países desenvolvidos, não acostumados com esse ritmo de preços, o que reforça riscos para os governos, como perda de popularidade, derrotas na base de apoio. Biden briga contra a queda de popularidade que ameaça os resultados das eleições para Câmara e Senado, em meio à diminuição de apoio num país polarizado, onde também pesam questões polêmicas como o aborto e a legislação sobre liberação de armas, nas quais ele tem sido derrotado. Macron, reeleito, já convive com a perda de apoio parlamentar. A Itália vem renovando as crises de governo em meio ao aprofundamento da crise econômica. No Reino Unido, apesar de Boris Johnson ter renunciado por outros motivos, a troca de comando ocorre em meio à necessidade de derrubar a maior inflação dos últimos 40 anos.
O bloco europeu, assim como os Estados Unidos, tenta reverter os avanços territoriais e econômicos de Putin, que tem demonstrado mais força que se previa tanto no campo da guerra, apesar da resistência também inesperada da Ucrânia, como na superação dos efeitos das sanções. Para isso tem contado com o aumento das exportações para a China e a Índia. Além da resistência da economia doméstica ainda impõe ameaças, como de um corte maior do fornecimento de gás, podendo provocar recessão até na Alemanha, referência econômica da zona do euro.
Diante dessa guerra, que pode se arrastar por mais tempo, com pressões sobre preços de energia e alimentos, fora outras consequências, e sem desconsiderar os reflexos inflacionários dos lockdowns da China e do desequilíbrio que persiste na oferta de insumos, os bancos centrais vão tendo de ajustar os juros. A dificuldade maior é buscar um ponto de equilíbrio que permita ganhos no controle da inflação, sem danos mais acentuados para a atividade.
Nesta semana foi destaque a decisão do Banco Central Europeu, que elevou os juros pela primeira vez desde 2011, com a taxa indo de -0,5% para zero, num ajuste maior que a previsão média, que era 0,25. E já antecipando continuidade da normalização dos juros nas próximas reuniões, sem indicação da dosagem, que vai depender de futuros indicadores. O BCE também adotou nova ferramenta, o Instrumento de Proteção de Transmissão, que permite a compra de títulos para evitar divergências de custos para os países que compõem a zona do euro, a depender das particularidades de cada economia. Esse movimento fez o euro registrar alguma recuperação após ter testado a situação inédita de ficar abaixo da paridade do dólar, mas sem muita força.
Na próxima semana será a vez de o Federal Reserve passar seu recado em relação à política de juros. A aposta dominante é de ajuste de 0,75 nas taxas, sem se descartar a correção em 100 pontos, diante das dificuldades de derrubar a inflação, hoje na faixa dos 9%, para a meta de 2%. Decisão que tem mais implicações sobre o fluxo de investimentos pelo mundo e comportamento de outros mercados.
O Brasil já tem sentido os efeitos dos movimentos de aversão ao risco na Bolsa, com perda de capital externo e de fôlego para recuperação, no câmbio, com o dólar rodando acima das expectativas, trazendo mais riscos para a inflação, e na curva de juros, que vem testando níveis superiores à projeção média da Selic, de 13,75%. O prêmio de risco sobe em função do aumento das incertezas em várias frentes. Além do cenário externo, tem as preocupações do lado fiscal e o risco institucional em relação às eleições. Independentemente da melhora das contas públicas neste ano, da queda da previsão da inflação, como consequência do corte dos tributos sobre combustíveis e energia, e de um avanço maior do PIB, pesa a expectativa de um cenário pior em 2023. O governo pode ter dificuldade de reverter algumas medidas do pacote de bondades, como o reforço do Auxilio Brasil, além de enfrentar outras pressões, como o reajuste do funcionalismo ou mais gastos com precatórios, comprometendo o fiscal. Já a possível reversão de algumas desonerações joga as previsões de inflação, de novo, acima do teto da meta. Isso em um ambiente de expansão mais fraca da atividade até pelo efeito da alta dos juros, além do contexto externo. Ainda não se sabe quais serão as diretrizes do governo, seja qual for o resultado das urnas, o que aumenta a insegurança. Sendo que o próprio processo eleitoral traz dúvidas pela insistência em se criar desconfianças quanto às urnas e à apuração de votos, sem qualquer fundamento.
É todo esse pacote de dificuldades e incertezas que tem aumentado muito a pressão sobre o mercado. De mais positivo para os investidores fica a oportunidade dos juros mais elevados, sempre com a preocupação de se prevenir contra possíveis reversões de tendência e marcação a mercado, que podem até ser proveitosas, dependendo da estratégia.
Por fim, vale observar que a pressão da curva de juros será um teste para a capacidade de o Banco Central gerenciar as expectativas, na medida em que tem sinalizado a intenção de dar uma pausa na elevação da Selic, possivelmente, quando chegar nos 13,75%, o que deve ocorrer na reunião do Copom em agosto.