A inflação continua sendo um dos grandes desafios globais, com implicações sobre o potencial de expansão das economias, seja pela necessidade de elevação dos juros, o que tem impacto contracionista sobre a atividade, seja pelo reflexo direto no poder de compra da população, inibindo o consumo. E como a inflação tem sido impulsionada muito mais por problemas da oferta do que da demanda, o desafio do controle fica muito maior.
É o cenário que temos quase desde o início da pandemia, tanto aqui como no exterior. As restrições impostas pela Covid, de início, até geraram deflação, com a queda abrupta da demanda por muitos produtos e serviços. Mas logo a retomada de algumas economias, especialmente da China, começou a gerar desequilíbrios. Vieram pressões mais fortes sobre alimentos, com a expansão do consumo. Por outro lado, as paralisações de atividade em vários setores levaram ao desequilíbrio na oferta de insumos e peças, desorganizando sistemas produtivos, com consequências também sobre os preços. A partir daí viemos com altos e baixos sendo que no caso do Brasil o dólar mais pressionado, até por questões políticas, e fatores climáticos reforçaram as pressões em vários sentidos, com destaque para alimentação e combustíveis. A escassez hídrica ainda levou a adoção da bandeira tarifária mais cara para a energia penalizando o custo de vida e os custos de produção. Com isso voltamos a inflação em dois dígitos, onde a indexação, ainda muito presente, cuidou de colocar mais lenha na fogueira dos aumentos.
Foi nessas condições que chegamos aos impactos da guerra da Ucrânia, que renovou as pressões de preços, novamente, com destaque para alimentos e combustíveis. Tudo isso com o Banco Central já pisando no acelerador dos juros, após um período em que optou por testar patamares muito baixos da Selic, com a taxa básica chegando ao nível inédito dos 2% ao ano. Aliás, o tombo da economia pós pandemia, além de ter levado à queda dos juros, ainda fez o governo lançar uma série de pacotes de estímulo, como o auxílio emergencial que, ao fortalecerem a demanda, também deram mais espaço para a alta dos preços de produtos básicos, como alimentos.
Hoje temos a inflação batendo recordes aqui é em vários países, de emergentes aos Estados Unidos, passando pelos países do bloco europeu, o que coloca em foco as melhores estratégias para reversão dessas pressões de preços, que têm implicações até políticas, dado o desgaste dos governos diante da perda de poder de compra da população, do aumento do custo de vida.
No Brasil temos até o governo lançando uma série de medidas pontuais, envolvendo o corte de impostos, pra tentar induzir alguma desaceleração de preços de maior peso, como combustíveis e produtos industriais. Como a pressão dos aumentos é mais forte, esses cortes acabam se diluindo por toda cadeia, sem maior impacto, e ainda levando a questionamentos do ponto de vista fiscal. A Selic, já em patamar contracionista, tende a avançar ainda mais, podendo chegar a uma faixa bem acima dos 13% sem que, por enquanto, tenha produzido qualquer diferença perceptível na evolução dos índices. Em contrapartida, a alta dos juros reforça as difculdades de avanço da economia, já prejudicada pelo peso da inflação no poder de compra dos consumidores, sem poder contar com outras alavancas de impulso. Daí as incertezas quanto aos futuros passos da política monetária e a divergência nas análises do mercado em relação à estratégia mais adequada para a política de juros. Fato é que estamos em meio a uma nova rodada de revisão para cima das projeções de inflação na expectativa que o Banco Central ainda consiga provocar uma convergência das expectativas para a meta, evitando novo estouro em 2023.
Mas há dúvida também quanto ao ritmo adotado pelo Federal Reserve, que iniciou o ciclo de alta dos juros em março, com ajuste de 0,25, já sinalizando que pode aumentar a dosagem para 0,50. Apesar do receio de possíveis implicações de um aperto maior sobre o fluxo de investimentos, os mercados e outras economias, muitos analistas ainda vêm uma postura insuficiente pra fazer frente à inflação que, no geral, segue persistentemente elevada. O aperto maior dos juros pode levar até a um movimento recessivo mais para o final de 2023 na economia norte americana, mas a inflação parece ser um mal maior a ser controlado.
A guerra da Ucrânia jogou muito mais incerteza nesse contexto, tanto em termos de evolução dos preços como do próprio crescimento, gerando dúvidas até quanto a problemas mais sérios na cadeia de insumos e alimentos. O dia a dia tem sido acompanhado com muita atenção para conferir a ação dos vários players, na tentativa de minimizar danos. É o caso, or exemplo, da liberação de reservas de petróleo e busca de fontes alternativas também para o gás que vem da Rússia.
É em meio a esse cenário que se nota uma volatilidade maior do mercado local, tanto no câmbio como na Bolsa, que deixaram pra trás a fase de maior empolgação. O Brasil ganha com a exportação dos produtos básicos mais caros, recebe mais fluxo, mas tem um custo interno que pode se reverter em mais inflação e condições piores de crescimento; Até os indicadores mais recentes de atividade, como os dados de Serviços e do Comércio, divulgados pelo IBGE, mostram esse impacto, com a evolução muito mais incerta e com menos fôlego. E a evolução desse cenário deve continuar tendo muita influência sobre o mercado, fora outras questões macroeconômicas e políticas. Mas é isso… a inflação voltou a assombrar o mundo, além de outros fantasmas, como o risco recente de uma guerra de maiores proporções.