As oito semanas que separaram a primeira e a segunda reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) de 2021 mostraram uma guinada radical na atuação do Banco Central (BC). No dia 20 de janeiro, o BC manteve a taxa referencial Selic nos 2 por cento ao ano que vinham desde meados do ano passado e indicou claramente que, apesar de todas as incertezas da economia, ainda era necessário que a política monetária permanecesse “extremamente estimulativa”, como diz o jargão do Copom. Na quarta-feira (17), o Comitê elevou os juros em 0,75 ponto percentual, acima do consenso, que previa uma alta de 0,50 ponto. E não parou por aí. No Comunicado divulgado após a reunião, o Copom deixou claro que vai promover outra elevação de 0,75 ponto percentual em maio. Em apenas 56 dias o BC passou de uma posição “dovish” (mais tolerante com a inflação) para “hawkish” (mais ortodoxa em termos monetários). Essa decisão surpreendente levanta duas perguntas: 1) será suficiente para conter a inflação? 2) será suficiente para impedir solavancos maiores na taxa de câmbio?
Começando pela inflação. A alta das commodities e dos combustíveis vem pressionando os índices de preços, como pode ser percebido pela segunda prévia do IGP-M de março, divulgada nesta quinta-feira. Isso elevou drasticamente os prognósticos para a inflação. Na última edição do Relatório Focus de 2020, o IPCA projetado para 2021 era de 3,32 por cento. Na edição mais recente, da segunda-feira (15), essa estimativa havia subido para 4,60 por cento (3,98 por cento na edição anterior). Isso indica que os agentes econômicos estão refazendo as contas para os preços. Nesse cenário, faz todo o sentido para um BC independente (ou apenas competente) apertar os juros. A questão é se o BC não demorou demais para agir, o que o obrigará a elevar a dose de elevação da Selic para fazer a inflação retornar para a meta. Quem investe dinheiro sabe que além de agir certo, é preciso agir no momento certo.
Isso leva ao câmbio. Considerando-se apenas o dólar comercial, a depreciação do real desde o início do ano está ao redor de 9 por cento, muito acima da inflação acumulada e dos juros do período. O dólar é um dos melhores indicadores da percepção de riscos com relação à economia. Há várias semanas, o BC diariamente vende dólares no mercado à vista e oferece contratos de “swap” cambial para reduzir a pressão de alta sobre a taxa de câmbio. Mesmo assim, a cotação da moeda americana vem se sustentando acima de 5,50 reais nas últimas semanas, e não dá sinais de engatar uma tendência de alta.
Pelo livro-texto, a elevação dos juros pelo BC aumenta a rentabilidade das aplicações em renda fixa. Isso teoricamente tornaria o real brasileiro mais atrativo em um cenário internacional de juros perto de zero e liquidez elevada. E, também teoricamente, traria mais dólares ao País, reduzindo a pressão de alta sobre o câmbio.
Essa teoria será confirmada na prática? Na abertura dos negócios nesta quinta-feira, os contratos futuros de dólar com vencimento em abril estão indicando um dólar a 5,50 reais, queda de 1,52 por cento em relação à véspera. A questão de vários trilhões de dólares, porém, é quanto a decisão do BC e sua sinalização para a próxima reunião conseguirão de fato ancorar as expectativas para a economia, reduzir a percepção de risco e fazer a inflação voltar aos trilhos.
Indicadores
Os aumentos da gasolina e do óleo diesel voltaram a pressionar a inflação. A segunda prévia do Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M) registrou uma inflação de 2,98 por cento no segundo decêndio de março, acima dos 2,29 por cento do mesmo período de fevereiro. Com este resultado, a taxa acumulada em 12 meses passou de 28,64 por cento para 31,15 por cento, informou a Fundação Getulio Vargas (FGV). O Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) subiu 3,72 por cento em março ante 2,98 por cento em fevereiro. O Índice de Preços ao Consumidor (IPC) subiu 0,89 por cento (0,29 por cento em fevereiro) e o Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) subiu 1,31 por cento ante 1,00 por cento.
Federal Reserve
O Federal Open Market Committee (Fomc), equivalente americano do Copom, confirmou as expectativas e manteve os juros americanos perto de zero. Em seu pronunciamento após a reunião, Jerome Powell, presidente do banco central americano, afirmou que a economia dos Estados Unidos deverá crescer 6,5 por cento neste ano e que, mesmo assim, o Fed deverá manter sua atitude mais tolerante com a inflação para não interromper o processo de recuperação econômica.
E Eu Com Isso?
Os contratos futuros de Ibovespa iniciaram o dia em alta, acompanhando a queda do dólar após o resultado da reunião do Copom. No entanto, os contratos futuros do índice americano S&P 500 estão em queda, o que deve elevar a volatilidade do mercado local.