Uma boa comparação com a decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) foi com uma corrida de longa distância entre o BC (Banco Central) e a inflação.
Durante quase todo o ano de 2021, a manutenção de uma política monetária frouxa fez com que a inflação ganhasse vantagem sobre o BC e se distanciasse cada vez mais. Agora, com a elevação da taxa referencial Selic em 1,5 ponto percentual, para 7,75% ao ano, e com a “promessa” de que haverá outro aumento da mesma magnitude na reunião de dezembro, o BC parece ter acelerado e ganho distância suficiente para empatar com a inflação.
Na prática, o BC vai aumentar os juros em três pontos percentuais, elevando a Selic de 6,25% para 9,25% ao ano. O único detalhe é que esse aumento se dará em duas etapas, com um intervalo de sete semanas entre eles.
E o Comunicado foi bastante claro em indicar um cenário adverso à frente. Uma comparação com o texto da reunião anterior, publicado no dia 22 de setembro, mostra várias alterações importantes em como o Copom vê a economia:
– o cenário externo para as economias emergentes tornou-se “mais desafiador”, ante um ambiente “favorável, mas que pode tornar-se desafiador”.
– a economia brasileira está mostrando uma “evolução ligeiramente abaixo da esperada” em vez de uma “evolução positiva com recuperação robusta no segundo semestre”.
– a projeção de inflação do Copom em 2021 subiu para 9,5% ante 8,5%, e o esperado em 2022 avançou para 4,1%, ante 3,7%.
– a projeção para os preços administrados, que incluem as tarifas públicas e que vêm sendo um espinho no pé do maratonista, subiu para 17,1% ante 13,1% em 2021 e para 5,2% ante 4,8% em 2022. O Copom manteve inalterada a hipótese de bandeira tarifária “escassez hídrica” até dezembro desde ano e de “vermelha patamar 2” até dezembro de 2023.
– a projeção de juros do Copom em 2022 subiu para 9,75%, ante 8,50%.
Para além dos números, o Copom foi muito claro ao admitir a gravidade da situação. “O Comitê avalia que recentes questionamentos em relação ao arcabouço fiscal elevaram o risco de desancoragem das expectativas de inflação”, diz o texto.
Isso “aumenta a assimetria altista no balanço de riscos” e “implica maior probabilidade de trajetórias para a inflação acima do projetado”.
E também não deixou dúvidas quanto ao tratamento prescrito, afirmando que “neste momento, o cenário básico e o balanço de riscos indicam ser apropriado que o ciclo de aperto monetário avance ainda mais no território contracionista” mesmo sabendo que “essa decisão implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego”.
A primeira tarefa de um banqueiro central é organizar as expectativas dos agentes econômicos para poder conduzir a política monetária de maneira eficiente.
Por isso, a interpretação desse comunicado mostra que o BC abandonou a suavidade no tratamento da inflação. Isso ficou claro quando o Comunicado reconhece a alta de preços, tanto no geral quanto nos administrados.
Na avaliação dos analistas da Levante Ideias de Investimentos há algumas críticas. Uma delas é que o Comunicado trata apenas de uma ancoragem “genérica”, sem especificar qual o período. E outra é que, nos últimos Comunicados, todas as decisões têm sido anunciadas como unânimes. Quem já observou dois economistas conversando sabe que unanimidade é fator escasso.
A velha piada é que quando três economistas conversam sobre um problema, eles sugerem quatro soluções para ele. E dificilmente a decisão de descumprir o que foi prometido no Comunicado e na Ata da reunião anterior, de elevar os juros em um ponto percentual, teria sido uma decisão unânime.
Qual a consequência de tudo isso?
O problema que já tratamos aqui e que continuaremos tratando. Enquanto não houver uma âncora fiscal firme para ancorar os preços, será necessário recorrer à âncora monetária, mantendo os juros elevados.
Assim, deverá haver uma revisão drástica para baixo nas expectativas de crescimento da economia brasileira em 2022.
Isso deve levar a revisões táticas na implantação de sua estratégia de investimentos. Porque, na maratona da economia, o BC pode até ter emparelhado com a inflação, mas ainda há muita pista pela frente.
Indicadores
O IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado) subiu 0,64% em outubro, após queda de 0,64% em setembro. Com este resultado, o índice acumula alta de 16,74% no ano e de 21,73% em 12 meses.
Em outubro de 2020, o índice havia subido 3,23% e acumulava alta de 20,93% em 12 meses. A queda menos intensa do minério de ferro, cujos preços recuaram 8,47% ante a queda de 21,74% em setembro, e a alta de 6,61% no preço do diesel pressionaram a inflação.
O IPA (Índice de Preços ao Produtor Amplo) subiu 0,53% em outubro, após queda de 1,21% em setembro. O IPC (Índice de Preços ao Consumidor) variou 1,05% em outubro, ante 1,19% em setembro. E o INCC (Índice Nacional de Custo da Construção) subiu 0,80% em outubro, ante 0,56% em setembro.
E Eu Com Isso?
O endurecimento da política monetária e o esperado desaquecimento suplementar da economia provocaram um impacto negativo no mercado, com os contratos futuros do Ibovespa iniciando o dia em baixa, apesar da alta em Wall Street.
As notícias são negativas para a Bolsa.
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