Relatório Trimestral de Inflação mostra piora das expectativas para o crescimento econômico e para a inflação
Principal documento conjuntural do Banco Central (BC), o Relatório Trimestral de Inflação (RTI) divulgado na quinta-feira (30) mostra que a autoridade monetária está bem menos otimista com relação à economia do que estava há alguns meses. Se a ideia for resumir o que se passa, é possível sintetizar o novo cenário pessimista em quatro palavras: risco fiscal e estresse hídrico.
Como o panorama visto pelo BC é determinante na formação da política monetária, vale a pena nos debruçarmos mais atentamente sobre o extenso RTI. O time de análise da Levante Ideias de Investimentos avaliou os pontos mais importantes do relatório, e traz essa síntese para você.
A inflação vai subir
A inflação em 2021 vai romper a meta. O Relatório não deixa dúvidas disso. O número esperado para os 12 meses até setembro é de 10,2 por cento, arrefecendo para 8,5 por cento no acumulado do ano. A causa é, basicamente, a seca. O “estresse hídrico” provoca um aumento nos preços dos alimentos e da energia, pois as geradoras têm de recorrer mais à eletricidade gerada pela queima do petróleo e do gás natural. Essa energia é mais cara do que a hidrelétrica, daí o aumento das tarifas.
Como a energia é prevalente para quase toda a atividade econômica (pense em uma empresa que funciona sem eletricidade), esse aumento de custos é repassado para a economia como um todo. Segundo o RTI, a projeção de inflação para os preços administrados (que incluem as tarifas de energia) em 2021 é de 13,70 por cento. Se confirmada, será a mais alta desde os 18,07 por cento de 2015.
Há outro motivo. A inflação está se retroalimentando devido ao aumento das expectativas dos investidores e dos empresários. Eles vêm revisando suas projeções devido ao novo cenário de alta do dólar e das commodities no mercado internacional. Só o minério de ferro tem sido um elemento a pressionar os preços no atacado, o componente mais importante dos Índices Gerais de Preços (IGP) da Fundação Getulio Vargas.
Agricultura e indústria fracas, serviços se recuperam
O Produto Interno Bruto (PIB) recuou 0,1 por cento no segundo trimestre de 2021 em relação ao trimestre anterior, interrompendo sequência de altas iniciada no terceiro trimestre de 2020. Em comparação com a edição anterior do RTI, o resultado veio ligeiramente acima das expectativas do BC e do Relatório Focus.
A perspectiva era de um desempenho pior devido à queda na atividade do setor agropecuário no segundo trimestre em comparação com os três meses anteriores. A estiagem afetou muito a safra de milho, e levou a uma revisão para baixo das estimativas para a safra de cana de açúcar, elevando os preços dos combustíveis. Segundo o RTI, esse fenômeno ainda deve aparecer nos dados do terceiro trimestre.
O cenário para a indústria também não é dos melhores. Problemas nas cadeias de suprimentos e redução na produção de automóveis – que depende muito dos fornecedores, muitos deles asiáticos – pressionaram os resultados para baixo.
A exceção foi o setor de serviços, que continuou crescendo e tem sido beneficiado pela recuperação da mobilidade desde o início de abril. Segundo o Relatório, a Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) e da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) da FGV mostram que o consumo de bens e de serviços já retornou ao patamar anterior à pandemia.
O cenário externo não ajuda
O Relatório mostra que o BC está menos animado com o cenário externo. Em momentos de crise, a economia brasileira sempre pode contar com a força das exportações, desde que haja compradores. No entanto, o panorama não é dos mais róseos. As economias asiáticas (leia-se China) devem crescer menos do que o esperado, devido à variante delta do coronavírus. Além disso, vários países emergentes (que concorrem pelo Brasil por recursos) tiveram de apertar suas políticas monetárias para fazer frente a altas da inflação, e os juros mais elevados tornam esses “concorrentes” mais competitivos na hora de atrair investimentos. E mesmo os Estados Unidos deverão ter de apertar suas políticas monetárias ainda no ano que vem, o que vai reduzir a liquidez internacional. Tudo isso pode tornar o ambiente “mais desafiador” para as economias emergentes.
Dúvidas no mercado de trabalho
O emprego é uma das variáveis econômicas mais importantes que os investidores acompanham. Ela é a mais “lenta”, pois é a que demora mais a reagir aos ciclos econômicos. As empresas hesitam em demitir no início da crise, para não ter de arcar, mais tarde, com os custos de contratação e de treinamento. Da mesma forma, elas adiam ao máximo a recontratação nos momentos de recuperação econômica, temendo se adiantarem ao fim das crises.
O RTI indica que houve uma melhora na taxa de desocupação medida pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) do IBGE. No trimestre de abril a junho essa taxa estava em 14,1 por cento. É uma queda de 0,6 ponto percentual ante os 14,7 por cento do trimestre anterior, e uma alta de 0,8 ponto percentual frente aos 13,3 por cento do segundo trimestre de 2020.
Apesar da melhora, o Relatório indica que “tanto a população ocupada como a força de trabalho permanecem em nível consideravelmente abaixo do período pré-pandemia, sinalizando um mercado de trabalho ainda frágil”. Há uma dificuldade adicional. No início deste ano, o Ministério da Economia alterou a metodologia do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). O “novo Caged” tem mostrado um desempenho mais favorável do emprego. Porém, “a diferença entre os números da PNAD Contínua e do Novo Caged mostra que permanece a dificuldade de avaliação do mercado de trabalho e sugere cautela com os resultados dessas duas fontes de informações.” Ou seja, apesar da recuperação, ainda é cedo para concluir que a crise passou.
Conclusão: apesar de algumas melhoras pontuais, na avaliação do BC o cenário permanece adverso para a inflação e para o crescimento da economia, devido às incertezas do ambiente externo e à seca. A estiagem aumenta os preços de alimentos, combustíveis e energia, o que mantém os a inflação em alta e obriga a apertos na política monetária.
Mesmo assim, sempre haverá oportunidades de investimentos, nas empresas que prosperam nos momentos em que a economia está em desaquecimento. Para encontrar essas oportunidades, você pode contar sempre com a equipe de analistas da Levante Ideias de Investimento.
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Um abraço, e até o próximo domingo.
Equipe Levante