É controversa a autoria da observação “fazer previsões é difícil, especialmente sobre o futuro”. Alguns dizem que é um provérbio dinamarquês ou alemão, e outros atribuem ao humorista americano Julius Henry Marx (1890-1977), mais conhecido como Groucho Marx. Se o nome do autor é irrelevante, a precisão dessa frase é inegável. Por isso, o primeiro Domingo de Valor de 2022 vai se abster de tentar fazer previsões sobre o que vai ocorrer neste ano que se inicia. Ao contrário, vamos simplesmente analisar os cenários que estavam dados na virada do ano passado e indicar como as variáveis mais importantes poderão – provavelmente – influenciar os preços dos ativos financeiros. E, acredite caro leitor, querida leitora: só essa tarefa é bastante complicada.
Em primeiro lugar, falemos do comportamento do Ibovespa, o principal indicador do mercado acionário brasileiro e das expectativas para com o resultado das empresas. No último pregão de 2021, o índice encerrou a 105,1 mil pontos. Para comparar, em 2020 o índice fechou o ano a 119 mil pontos. Na ponta do lápis, uma queda de 11,9 por cento. Foi a primeira vez que o índice encerrou um ano no negativo desde 2015. Ou seja, nem durante a pandemia a bolsa retrocedeu na comparação anual. O que ocorreu?
A guinada das expectativas
Simples: uma piora das expectativas a nível global. Essa história pode ser contada com uma variável, as cotações do minério de ferro no mercado internacional. O padrão é usar os preços no porto chinês de Tianjin, para minério com 63,5 por cento de hematita. Só como observação, o minério produzido pela Vale (VALE3) tem um teor mais elevado, o que garante preços diferenciados. Mas os preços pagos pelo minério de qualidade superior da Vale oscilam em linha com os do minério padrão.
Pois bem. No fim de 2020, a tonelada do minério em Tianjin estava cotada a 159 dólares. Agora, ela vale 112 dólares, uma queda de cerca de 30 por cento. Um ano ruim, mas aparentemente tranquilo. No entanto, observar apenas essas duas cotações não conta que, em maio, o minério bateu o recorde histórico de 229 dólares por tonelada e que, seis meses depois, em novembro, ele havia recuado para 78 dólares, menor cotação em 16 meses. Em apenas um semestre, a cotação de uma das principais commodities minerais recuou 66 por cento.
O fim das certezas
Essa volatilidade absurda deveu-se à brutal reversão das expectativas do mercado. No início do ano, os investidores tinham três certezas. A primeira era que as medidas de restrição decorrentes do coronavírus estavam superadas. A segunda era que a economia global iria retomar seu crescimento. E a terceira era que a liquidez permaneceria elevada, com os bancos centrais prosseguindo com as medidas de estímulo direto e mantendo os juros baixíssimos ou negativos.
As três certezas se dissiparam ao longo do ano. Surtos periódicos provocados por novas variantes do coronavírus, problemas nas cadeias globais de suprimentos e a preocupação com a inflação provocaram correções e alterações nos cenários dos investidores, todos apontando para uma conjuntura mais adversa para a economia. Apesar de os índices acionários americanos terem registrado recordes sucessivos, as commodities e as ações de outros mercados sofreram com a nova conjuntura.
Problemas brasileiros
E no Brasil? Por aqui, além dos problemas que afetaram o cenário global, houve dois problemas adicionais. O primeiro foi a alta da inflação, e o segundo foi a recaída populista do governo federal. Os preços subiram. O IGP-M cravou 17,78 por cento em 2021, e o IPCA nos 12 meses até novembro indicou 10,74 por cento. Isso deveu-se à alta do dólar e das commodities no mercado internacional e à pior seca em 90 anos, que afetou as colheitas e encareceu os alimentos. A inflação, que sempre foi um problema crônico na economia brasileira, ganhou tração e se espalhou para diversos setores da economia. A receita para fazer o velho dragão voltar à caverna é austeridade, tanto fiscal quanto monetária.
Aí chegamos no segundo problema. No apagar das luzes do governo Temer, contra todas as expectativas, o Parlamento aprovou a lei do Teto de Gastos, um aperfeiçoamento da Lei de Responsabilidade Fiscal. O regime forçado que manteve o orçamento público mais ou menos controlado rendeu bons frutos. O risco-país ficou comportado, os investimentos internacionais vieram e, apesar dos sacrifícios da pandemia, o mercado subiu em 2020.
Porém, ao longo do ano, o Executivo acompanhou, impassível, os esforços do Congresso para poder liberalizar a gastança. E, como resultado, a percepção internacional sobre os riscos de se investir por aqui piorou muito. O dólar subiu, e encerrou 2021 com uma apreciação de quase 9 por cento diante do real. As ações caíram. E os investidores internacionais, tanto os diretos quanto os em portfólio, se retraíram.
Cenário desafiador
O que esperar para este ano? As principais variáveis que se firmaram no ano passado deverão permanecer. A percepção dos analistas da Levante Ideias de Investimentos é que haverá um cenário fiscal complexo, ainda mais devido ao ano eleitoral. Para piorar, a inflação vai demorar para baixar. A meta de inflação estabelecida para este ano pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) é de 3,5 por cento, com 1,5 ponto percentual de tolerância para mais ou para menos. Assim, o teto da meta é 5,0 por cento. Na última edição do Relatório Focus de 2021, a projeção para o IPCA neste ano era de 5,03 por cento. Acima do teto, ainda que marginalmente. Claro, isso é uma estimativa que terá de se confirmar ou não durante 12 meses. Porém, já indica que o caminho do Banco Central não será fácil.
Fiscal em xeque, inflação em alta pedindo uma política monetária estrita e, para piorar, uma eleição presidencial que promete ser tudo menos tranquila. Esses não são os ingredientes para um mercado em alta e uma economia retomando tração. Por isso, apesar de evitarmos fazer previsões, é possível antecipar que 2022 será novamente um ano desafiador, palavra que tem ficado desgastada pelo uso nos últimos tempos.
O que fazer? Para navegar nessas águas que prometem ser agitadas, você pode sempre contar com os analistas da Levante Ideias de Investimentos.
Um abraço, bons investimentos e feliz 2022.