O Copom, mesmo confirmando o que tinha sinalizado (uma alta de 1,5 da Selic, agora em 9,25% a.a.), acabou surpreendendo com o tom mais pesado do comunicado que saiu junto à decisão, sem demonstrar maior preocupação com a desaceleração da economia, a recessão técnica e a frustração com dados mais recentes de atividade, como os da indústria e do comércio. Superando a média das expectativas, já contratou mais um aumento de 1,5 para a taxa básica na primeira reunião de 2022, insistindo na intenção de provocar a convergência das projeções para as metas dos próximos anos.
Essa posição do BC levou o mercado a refazer as contas de quanto os juros podem subir, para produzir os efeitos esperados, e o impacto que todo o ajuste poderá ter sobre a atividade e o desempenho dos vários setores. Há quem já conte com a Selic em 12,25% a partir da postura hawkish do comunicado. Vale lembrar que a insistência nessa estratégia de aperto monetário, para garantir a desinflação e a ancoragem das expectativas em torno das metas, tem relação com o fato de as projeções do mercado estarem estouradas em 2021, com 10,18% no Focus, o que dá quase o dobro do teto; em 2022, em 5,02%, ante o teto de 5%; e em 2023 com 3,5%, superando o centro da meta, de 3,25%. Por mais que se conte com uma desaceleração da inflação até meados do próximo ano, as previsões só têm piorado.
Por outro lado, fica uma preocupação maior quanto a um possível exagero da política monetária, que tem um tempo para produzir resultados e pode acabar penalizando demais a atividade. Sendo que as expectativas para a atividade também têm passado por uma revisão, para pior, até pelo consumo mais restrito de boa parcela da população, o que tende a colaborar para uma perda de ritmo dos reajustes de preços. Ainda que o BC possa rever a posição até a próxima reunião, cortando o ritmo dos aumentos, o mercado já faz novos ajustes na curva curta e longa dos juros, com implicações sobre a rentabilidade da renda fixa. Também está revendo o potencial de desempenho dos vários setores, que sofrem influência positiva ou negativa dos juros mais altos, como os bancos e as empresas de varejo, por exemplo. E resta uma certa dúvida até quanto ao impacto no câmbio, onde a atratividade maior dos juros pode ajudar a manter o dólar em patamar mais baixo. Só que também se percebe uma certa preocupação do BC com as incertezas dos agentes em relação ao arcabouço fiscal e o impacto de possíveis mudanças nas políticas dos Bancos Centrais pelo mundo, que agiriam em sentido inverso.
Os dados mais recentes de seguro-desemprego e inflação nos EUA reforçam o tapering pelo Federal Reserve, além do possível aumento dos juros em 2022. Já na Europa mudanças podem ser adiadas pelo temores ainda decorrentes da pandemia, não só pela variante Ômicron, mas também pela resistência às vacinas, que tem levado a novas restrições, diante do aumento do número de infectados e até de mortes, como os recordes registrados na Alemanha.
O comportamento do mercado tende a ser pautado por todos esses temas, já que notícias mais favoráveis, como a aprovação da PEC dos Precatórios, mesmo com toda a polêmica que ainda gera, já tinha sido precificada, ajudando a alavancar um desempenho melhor da Bolsa, com acomodação do dólar em patamar mais baixo. Mas a própria PEC, com aprovação fatiada, ainda pode trazer alguma incerteza, caso a Câmara não confirme o carimbo da folga orçamentária, dando margem para mais gastos. Nesse sentido, o presidente Bolsonaro voltou a reforçar as preocupações, ao defender reajustes para os servidores, citando vários percentuais. Como a equipe econômica não tem resistido muito a essas iniciativas, a questão fiscal ainda pode, de fato, produzir mais volatilidade sobre os negócios, especialmente em 2022, com a proximidade das eleições. Não foi sem motivo que o comunicado do Copom observou as incertezas quanto ao arcabouço fiscal, apesar da melhora recente das contas públicas. Fato é que o Banco Central ainda não conseguiu ancorar as expectativas sequer quanto aos futuros passos da política de juros.
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