A economia brasileira tem convivido com sucessivos desafios que se interligam. Nesta semana tivemos a aprovação da PEC dos Precatórios na Câmara, o que trouxe um certo alívio porque pode evitar riscos fiscais maiores que viriam com um eventual plano B do governo. Este poderia, por exemplo, por meio da decretação de um estado de calamidade, abrir espaço para gastos com menos limites. Agora a decisão está com o Senado, que pode promover alterações, especialmente no uso dos mais de R$ 90 bilhões que devem ser obtidos de folga orçamentária, e até atrasar a aprovação. Por isso, o governo já se previne com uma MP que pode assegurar, em dezembro, o pagamento do novo Auxílio Brasil, com valor mínimo de R$ 400,00. É uma forma de evitar frustração para os que recebiam o extinto Bolsa Família.
Mas desse processo todo, apesar do alívio com a PEC, ficou uma incerteza maior do ponto de vista fiscal, já que, além de alterar o teto de gastos, dando um drible em uma das mais importantes regras de contenção de despesas, o governo ainda decidiu unilateralmente postergar parte das dívidas referentes às sentenças judiciais, os precatórios. Não sem motivo a Proposta ficou conhecida como “PEC do calote”. Fica o risco do acúmulo das dívidas adiadas, sem se descartar novas manobras desse tipo, para viabilizar mais gastos, especialmente em 2022, ano de eleições. Aliás, por mais que se fale da importância social do novo programa, é impossível desvinculá-lo dos interesses políticos. Até o STF ficou em alerta, posicionando-se contra as emendas do relator, para evitar as barganhas em troca de votos através da liberação dos recursos via orçamento secreto.
Também nesta semana tivemos, de novo, a inflação superando as expectativas com o IPCA de outubro em alta de 1,25, diante de uma disseminação maior dos aumentos, que vai dos combustíveis ao setor de Serviços, passando pelo aumento dos preços de bens industriais, que refletem outros aumentos de custos, como a escassez de insumos e peças, altas de commodities, do dólar e da energia. Situação que piora as perspectivas para a inflação deste e do próximo ano. Para 2022 já se trabalha com variação do IPCA perto do teto da meta, de 5%. A deste ano pode passar de 10%.
Essa situação, claro, leva o mercado a contar com aumentos da Selic, além da dosagem já redefinida pelo Copom, que seria o aumento de 1,5 dos juros básicos a cada reunião, com a taxa fechando o ano em 9,25%. Só que aí tem o outro desafio: a perda de ritmo da atividade econômica. Fora a inflação, a semana também reservou a frustração com a queda de 1,3% das vendas do Comércio, em setembro, e retração de 0,4% no trimestre, voltando a ficar abaixo do patamar pré-pandemia. Além dos dados do mês, piores que o previsto, ainda houve revisão dos do mês anterior, que também foi de queda. Por mais que a inflação tenha influência nesse processo, pelas perdas que provoca no poder de compra do consumidor, aumentar os juros de forma mais acentuada pode reduzir ainda mais o potencial de expansão da economia. O setor de Serviços é dos poucos que trazem algum alívio, em termos de retomada, mas também pode sentir os efeitos da inflação mais alta. Aliás, a recomposição dos preços do setor tem sido um dos fatores de pressão inflacionária.
Enfim, os indicadores desta semana estão levando a uma nova rodada de revisão, para cima, das projeções de inflação, e para baixo as do PIB, com incertezas quanto à política de juros e à gestão das finanças públicas. Nesse contexto ainda é preciso considerar as implicações da inflação em alta também em outros países, especialmente nos Estados Unidos, o que muda nos recados dos bancos centrais, as pressões de commodities no mercado internacional e o desequilíbrio ainda persistente entre oferta e demanda e até escassez de mão de obra, fora a crise de energia e aumento dos casos de Covid em locais onde há maior resistência à vacinação.
De qualquer modo, o mercado brasileiro engatou um movimento mais favorável após ver chances mais concretas de a PEC avançar no Senado, principalmente com a relatoria ficando a cargo do líder do governo, senador Fernando Bezerra. Em tese, a leitura é que isso pode estabelecer uma condição de menos incerteza do lado fiscal. A Bolsa acompanha os resultados da safra de balanços e o dólar antecipa possíveis efeitos da alta dos juros, sobre fluxo de capitais. Fato é que, depois de uma fase de extrema tensão, volatilidade e dispersão das apostas, o mercado tenta engatar um movimento mais positivo e baseado em fundamentos, não nas dúvidas que surgem no dia a dia. Mas as incertezas continuam presentes, em vários sentidos, e ainda podem produzir muita volatilidade.
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