Está lá, em todos os livros-texto que tratam de investimentos. Juros e bolsa apresentam movimentos opostos. Quando os juros sobem, a atividade econômica desacelera. O capital de giro fica mais caro para os empresários. Os resultados das empresas encolhem. E, com menores lucros, as ações baixam de preço.
Ao contrário, quando os juros encolhem, os resultados das empresas melhoram e as cotações avançam. Isso vale para qualquer mercado acionário, e o Brasil não é exceção.
A Ata da 239ª reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), divulgada na terça-feira (22), surpreendeu um pouco pela transparência com que afirmou que os juros podem subir.
Até poucos dias antes da reunião, realizada nos dias 15 e 16 de junho, a convicção dos investidores era de uma alta moderada das taxas para não afetar o ainda incipiente processo de melhora da economia.
No entanto, os participantes do Comitê frisaram, no documento divulgado ontem, que a inflação ameaça sair do controle e que a recuperação do nível de atividade da economia brasileira tem sido mais acelerada do que se previa anteriormente.
Essa alteração na percepção já havia sido notada pelos investidores. Na edição mais recente do Relatório Focus, divulgada na segunda-feira (21), o prognóstico para a taxa Selic de dezembro deste ano subiu para 6,25%.
E não seria surpresa se essa estimativa fosse novamente corrigida para cima nas próximas edições. Assim, há poucas dúvidas de que os juros vão subir. A grande pergunta é: essa trajetória de alta pode afetar o desempenho das ações?
Indo direto ao ponto: provavelmente não. Claro que uma taxa Selic a 2% ao ano é mais “estimulativa” (para usar o jargão do BC) para as ações do que juros a 6%.
No entanto, é preciso considerar as características e os limites da economia brasileira.
Indo por partes. A economia brasileira é fechada e oligopolizada. Ou seja, há um componente estrutural de inflação de demanda que é bastante forte: não é possível, como em economias abertas, compensar altas pontuais de preços pela importação.
Sem falar que boa parte dos itens são não comercializáveis (os chamados “non tradeables”). Além disso, muitos itens relevantes nos índices de inflação têm seus preços calibrados ou pelo mercado internacional ou pelo dólar.
Commodities e câmbio vêm em uma trajetória de alta (apesar da baixa do dólar nos últimos três dias). E isso é mais uma fonte de pressão estrutural sobre a inflação.
Assim, a manutenção de juros muito baixos por muito tempo em um cenário de economia internacional aquecida e commodities em alta poderia, para seguirmos com o jargão do BC, “desancorar” as expectativas de inflação.
Em um país com a memória inflacionária tão preservada quanto o Brasil, isso é muito perigoso.
Por isso, mesmo provocando alguns solavancos no dólar e nas ações no curto prazo, a alta da Selic até um patamar “razoável” não é ruim para a Bolsa, pois ajudará a manter a inflação contida em níveis sustentáveis.
E quanto é esse “razoável”? É difícil prever os números com precisão. Mesmo assim, podemos considerar juros entre 6% e 7% ao ano como sustentáveis.
A situação poderia ficar adversa para as ações se a Selic superasse 8% ao ano. No entanto, essa é uma possibilidade bastante remota.
E Eu Com Isso?
A quarta-feira começa com movimentos díspares nos mercados brasileiro e americano.
Os contratos futuros de Ibovespa iniciam a sessão perto da estabilidade, ao passo que os contratos futuros do índice S&P 500 estão em leve alta.
Essa disparidade e a continuidade dos ajustes às novas expectativas para os juros devem acentuar a volatilidade.
As notícias são positivas para a Bolsa em um cenário de volatilidade.
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