O auxílio emergencial de 600 reais, posteriormente prorrogado até o fim deste ano com metade do valor inicial, foi um dos poderosos instrumentos que possibilitou a recuperação mais robusta da economia brasileira frente à pandemia de Covid-19. Sua potência fez jus ao custo fiscal para o exercício orçamentário deste ano, sendo estimado em mais de 300 bilhões de reais para as contas públicas.
Nesse contexto – diante de um Brasil altamente endividado e que sofre com sucessivos déficits primários, ou despesas correntes maiores que receitas correntes –, a prorrogação do benefício emergencial seria bastante nociva à política fiscal do País, que precisa retomar a trajetória de austeridade da forma mais breve possível.
Paulo Guedes, o ministro da Economia, tem reiterado que o auxílio tem data para ser extinto: após o dia 31 de dezembro de 2020, junto com o fim do Orçamento de Guerra e o estado de calamidade pública instaurado no País. Guedes tem tentado tranquilizar investidores em meio aos receios de uma segunda onda brasileira de contaminação e mortes, que poderia levar à necessidade de um amparo mais extenso por parte do governo.
Nos bastidores, contudo, o governo vai fazendo a lição de casa para lidar com o pior cenário possível. Segundo o próprio ministro, a equipe econômica já identificou a parcela de beneficiários que precisaria, imprescindivelmente, continuar recebendo o auxílio no caso de uma segunda onda. Agora, os técnicos do ministério estudam como, eventualmente, estender o pagamento sem furar o teto de gastos. Ainda há dúvidas se seria possível lançar mão de créditos extraordinários para abarcar uma possível prorrogação do auxílio.
Impactos na prática
Nesse momento, o nosso cenário-base não contempla a ampliação do benefício concedido emergencialmente em 2020 para o ano de 2021. Diferentemente dos outros países (a exemplo dos europeus), o Brasil teve um platô de contaminação por um longo período, o que ameniza a possibilidade de novos picos de casos. Naturalmente, espera-se que haja um leve aumento na curva, à medida que as restrições de circulação e comércio vão sendo eliminadas, mas esse movimento não deve ser suficiente para promover um novo lockdown da maneira que conhecemos no primeiro semestre deste ano.
Ao mesmo tempo, o governo sabe que os elevados gastos devem ficar restritos ao exercício de 2020, em um esforço para retomar a trajetória de ajuste fiscal iniciada após a crise econômica de 15-16. Acreditamos também em um desfecho positivo, em breve, envolvendo uma vacina para o vírus – mais um motivo para desconsiderar a prorrogação do auxílio. Ao mesmo tempo, o governo deve, pelo menos, apresentar uma nova versão para o Bolsa Família para aumentar a gama de beneficiários – muito mais restrita, porém, no comparativo com o benefício distribuído durante a pandemia.
Investidores ficam à espera de uma apresentação oficial das medidas a serem tomadas para o governo neste fim de ano e início de 2021. Nela, possivelmente, deve-se confirmar que o auxílio realmente chegará ao fim. Enquanto isso, o grau de incerteza sobre o fiscal continua elevado e contamina as expectativas sobre variáveis macro brasileiras. Passando o segundo turno das eleições municipais, será a hora do Planalto entrar em cena.