Há poucas dúvidas de que o Comitê de Política Monetária (Copom) vai começar a elevar a taxa referencial de juros Selic na reunião que começa amanhã (16) e vai até a quarta-feira (17). Atualmente, a Selic está em 2 por cento ao ano. Considerando-se como válida a inflação prevista de 4,60 por cento na edição mais recente do Boletim Focus, os juros reais estão quase 2,50 por cento negativos.
Juro real negativo é algo inédito no Brasil na última geração. A política monetária tem sido restritiva desde o início do Plano Real, para conter a inflação em um ambiente de finanças públicas cronicamente desarrumadas. Juros altos tornam a rentabilidade da renda fixa imbatível, e dificultam o investimento em ações. Quando eles recuam, as ações tornam-se muito mais atrativas como investimento.
Os números mostram isso de maneira indiscutível. No fim de 2018, quando a Selic estava em 6,50 por cento, o Ibovespa encerrou o ano a 87.877 pontos. Na sexta-feira (12), o índice fechou a 119.472 pontos, alta de 29,9 por cento nesse período, apesar dos solavancos e da pandemia. E no dia 8 de janeiro, quando as notícias ainda eram ruins, o Ibovespa chegou a seu recorde histórico de 125.077 pontos.
Esses números simples provam a relação direta entre a queda dos juros e a alta das ações. Quando a Selic começou a cair de maneira estrutural e sustentável, houve um grande afluxo de novos investidores para a Bolsa. Agora, as expectativas dos investidores é que o Banco Central (BC) fará jus a seu mandato e vai elevar os juros para conter a aceleração da inflação. Isso vai derrubar a bolsa e tornar os investimentos em ações inferiores às aplicações em renda fixa?
A resposta é NÃO, por dois motivos. Vamos voltar à primeira regra para entender o funcionamento do mercado. O principal motor dos preços das ações são as expectativas. As expectativas de alta da Selic já são bem conhecidas e estão razoavelmente bem expressas nos preços. O que falta, agora, é reduzir a dispersão das estimativas com relação aos juros, algo que deve ocorrer após a divulgação do Comunicado posterior à reunião do Copom. Assim, a confirmação das expectativas deve ter um efeito restrito sobre as taxas futuras de juros.
Para entender o segundo motivo, analisemos a alta recente da inflação. O IPCA de fevereiro subiu 0,86 por cento. Em 12 meses a inflação está em 5,20 por cento, rondando o teto da meta, que é de 5,25 por cento (3,75 por cento mais 1,5 ponto percentual de tolerância, para mais ou para menos). Essa aceleração da inflação não ocorreu porque a economia está aquecida, mas devido a aumentos nos preços dos combustíveis, das commodities e dos alimentos. É uma clássica inflação de custos, não uma inflação de demanda. E nesses casos é comum a inflação se retroalimentar. Por exemplo, os fornecedores de combustíveis elevam os preços preventivamente, esperando um aumento de custos mais adiante, e o ciclo se perpetua.
Ao elevar os juros, o BC pode realizar uma “freada de arrumação”, alinhando as expectativas e reduzindo a pressão dos aumentos preventivos. Ao estabilizar a projeção de inflação, a decisão do Copom vai diminuir a pressão de alta dos juros futuros, que tem muito mais influência sobre os preços das ações do que as taxas à vista. Moral da história: devido à situação bastante atípica da economia brasileira, que registra uma alta da inflação com uma economia desaquecida, o aumento dos juros será positivo para os preços das ações, pois reduzirá as incertezas sobre o futuro.
Indicadores
O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), considerado prévia do Produto Interno Bruto (PIB) subiu 1,04 por cento em janeiro ante dezembro. Em comparação com janeiro de 2020 o IBC-Br subiu 1,27 por cento, considerando-se os dados dessazonalizaados. A alta foi superior às expectativas, que eram de 0,5 por cento de crescimento.
Boletim Focus
A edição mais recente do Boletim Focus mostrou uma forte aceleração nas projeções para a inflação. O IPCA previsto para 2021 subiu para 4,60 por cento ante 3,98 por cento da estimativa anterior, e acima dos 3,62 por cento esperados há quatro semanas. A projeção para o PIB também voltou a recuar, caindo levemente para um crescimento de 3,23 por cento ante os 3,26 por cento da semana anterior. A taxa Selic projetada para dezembro avançou para 4,50 por cento, ante os 4 por cento da semana anterior. As projeções para o dólar previsto para dezembro também subiram, alcançando 5,30 reais ante 5,15 reais da projeção anterior.
E Eu Com Isso?
Os contratos futuros de Ibovespa iniciam a semana em baixa de quase 0,8 por cento, devido à incerteza com relação à política. A sessão também é marcada pelo vencimento de opções sobre ações, que deve adicionar volatilidade ao índice, além dos dados do Boletim Focus e do IBC-Br de janeiro.