As incertezas em relação às propostas que envolvem a questão fiscal continuam interferindo muito nos movimentos do mercado e na percepção do risco País. Propostas que, por iniciativa ou com endosso do Ministério da Economia, dão a ideia de uma preocupação em reforçar o Caixa, para se ter mais margem de manobra para medidas que, em 2022, possam garantir maior popularidade para o governo.
É o caso até das mudanças no IRPF. Mudanças, sim, porque não dá pra falar em Reforma quando se trata de alterações não só de IR, mas de vários tributos, que, no fim das contas, podem levar a um aumento da carga tributária, como têm alertado muitas entidades e associações de classe, além de uma maior complexidade, já que vários pontos têm condicionalidades para aplicação, como a própria redução do IR. Sem esquecer de possíveis perdas para Estados e municípios. Vale ressaltar que até os efeitos para a arrecadação federal são questionados, já que o governo tenderia a reforçar a receita com a taxação de lucros e dividendos, mas vários tributaristas alertam para manobras contábeis que podem reduzir o encargo e até mesmo a sonegação em prazo mais longo.
Ainda que passe na Câmara, cuja votação foi adiada para a próxima semana, com o relator protocolando uma nova versão, a proposta pode esbarrar no Senado, onde ganha força a PEC 110, que prevê a fusão de tributos e a simplificação do sistema tributário, que é o que se esperava da Reforma. Por enquanto, as mudanças do IR parecem um quebra-cabeças, montado para minimizar críticas, sem que se tenha mais segurança quanto ao impacto que terá em vários sentidos.
Para o ministro Paulo Guedes, a proposta em tramitação na Câmara ainda é uma forma de reduzir o encargo para as empresas, taxar os que recebem muito em lucros e dividendos, até para adequar o Brasil às regras da OCDE, e quem resiste são exatamente os que mais ganham com as condições atuais.
Mas além dos impasses em relação à questão tributária, há as incertezas quanto ao Bolsa Família ou ao Auxílio Brasil, quanto demandará de recursos e se caberá no teto de gastos. Paralelamente, há muito questionamento com relação à PEC dos Precatórios, ainda vista como uma forma de regularizar um calote nas sentenças judiciais, para as quais o governo deveria ter se preparado, com cortes de outras despesas. A mesma PEC ainda gera críticas pela criação de um Fundo com recursos de privatizações, vendas de imóveis, participação no petróleo, para bancar despesas; e o drible na regra de ouro, ao colocar a possibilidade de a proposta orçamentária já incluir créditos para cobrir despesas, sem necessidade de aprovação do Congresso.
Independentemente das justificativas do governo, até aceitáveis em alguns aspectos, há uma preocupação maior quanto á gestão das finanças, que tem pesado no movimento do mercado, assim como o clima político, os impasses entre os poderes e possíveis desdobramentos da CPI. São fatores que podem manter a volatilidade ainda por um bom tempo, especialmente por estarmos caminhando para um ano de eleições, que promete muita polarização. Sendo que nessa relação de incertezas domésticas sempre é bom lembrar das preocupações que vêm do exterior, com destaque para a possível antecipação do corte dos estímulos pelo Federal Reserve nos Estados Unidos.
Crescimento maior da economia previsto para este segundo semestre, bons resultados das empresas, avanço de uma parte positiva da agenda econômica, como privatizações, concessões e marcos regulatórios, vacinação, controle da pandemia, maior flexibilização das atividades podem alavancar um cenário mais benigno. Mas do outro lado, tem ruído demais atrapalhando a definição de uma tendência mais favorável, com menos instabilidade dos ativos.
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