Em meio à paralisia muito grande por parte do governo, no que se refere ao encaminhamento de pautas, dá para perceber que há possibilidade de esforço no Congresso para a aprovação de matérias relevantes.
Importante observar que houve adiamento das discussões de medidas na área fiscal, inclusive do orçamento, para depois das eleições, por uma decisão do Executivo. Além das preocupações quanto à adoção de medidas não populares, como as que mexem com o funcionalismo ou cortes de benefícios, ainda se considerou a falta de mobilização em função da proximidade das eleições. Mas o avanço de algumas pautas no Congresso mostrou situação inversa.
Votações importantes que ocorreram nesta semana, mesmo com o foco global nas eleições dos Estados Unidos e a proximidade das eleições aqui, mostraram que não é bem assim. Especialmente quanto a pauta é boa, a mobilização acontece.
Foi aprovada no Senado a autonomia do Banco Central, que vinha sendo adiada há muito tempo, importante para formalizar a independência do BC na gestão da política monetária.
Os congressistas também aprovaram a derrubada do veto do presidente à prorrogação da desoneração da folha até o final do ano que vem, para 17 setores que empregam cerca de 6 milhões de pessoas. Discussão adiada por semanas para ver se o governo encontrava uma saída, sob a alegação do custo que terá no orçamento e até alguns questionamentos legais.
Foi só colocar em pauta que a votação aconteceu, com participação expressiva e apoio até da base aliada. Sinal de que também há espaço para negociações, acordos…
Fica evidente que está nas mãos do governo o encaminhamento, com urgência, das pautas prioritárias, como as que podem viabilizar o orçamento do próximo ano, respeitando o teto de gastos, até com a inclusão do Renda Cidadã, se esse ainda for o objetivo.
Sob a desculpa das eleições, se deixou de falar até das intenções do governo quanto à criação de um programa social mais amplo que o Bolsa Família. Foi bom em um certo sentido porque deixou de gerar instabilidade pelas sucessivas idas e vindas.
A falta de um projeto bem definido, balões de ensaio, reforçam incertezas quanto ao potencial de sustentação, não só do ajuste das finanças, mas também da retomada do crescimento. E as duas coisas estão interligadas. Para crescer é preciso alavancar investimentos e o dinheiro só vem se houver confiança na capacidade de o governo colocar as finanças em ordem.
Nesta semana, tivemos uma mudança de foco. Até o mercado só refletiu o andamento das eleições nos Estados Unidos. Mas, em algum momento vai voltar a atenção para as questões domésticas, e o clima de empolgação que temos visto pode passar.
As indefinições continuam e seria muito bom que o governo visse essas mobilizações do Congresso como uma oportunidade para fazer a agenda andar. Não que se consiga aprovar reformas de uma hora para outra. Isso não vai acontecer. O que interessa no curto prazo são mudanças concretas que proporcionem segurança quanto às perspectivas de evolução das finanças e da economia.
Não interessa, por exemplo, ficarmos com divagações quanto à criação ou não de um imposto sobre transações digitais. Até porque o reforço de caixa não interfere no teto. O que pode definir perspectivas melhores agora são cortes de despesas que viabilizem o teto, que ofereçam mais margem de manobra no orçamento, como a PEC Emergencial.
Enfim, por mais que o tempo seja curto, com eleições, proximidade de final do ano, possibilidade de o recesso não ser suspenso, se o governo arregaçar as mangas e apresentar um projeto crível, bem negociado, consegue a mobilização política necessária. E, hoje em dia, em princípio, até conta com uma base maior para isso. A proximidade com o centrão não era para facilitar as negociações com o Congresso? Falta mostrar, na prática, o quanto que isso pode ser produtivo para o País e não apenas para o jogo político.