Acabou a novela da PEC dos Precatórios e, consequentemente, do Auxílio Brasil, cujo projeto também foi aprovado. Com o espaço orçamentário aberto pela PEC, o benefício poderá ter a ampliação prevista. O mercado teve uma reação favorável, mas, vale lembrar, após uma repercussão inicial bem negativa, que colaborou para a piora geral de indicadores e projeções. O dólar em alta, uma das reações, reforçou as pressões inflacionárias, que acabaram por intensificar os ajustes na taxa básica de juros. A Bolsa testou patamares inéditos de queda. A credibilidade do País foi arranhada, comprometendo o fluxo potencial de investimentos. Condições que tiveram reflexo também nas perspectivas de menor expansão da economia no próximo ano. Cenário que ainda poderá incorporar o carregamento da recessão técnica confirmada por dois trimestres consecutivos de retração do PIB.
A reação favorável do mercado, agora, à aprovação da PEC tem relação com o fato de que acaba por impor alguns limites para os gastos do governo. Sem a PEC havia muito mais insegurança quanto ao que poderia fazer para viabilizar o Auxílio Brasil. Nesta semana mesmo se voltou a falar em orçamento de guerra. Mas a alteração na forma de correção do teto de gastos mexeu com a confiança e ampliou o risco fiscal, o que ainda tende a ter repercussão sobre a avaliação e atratividade do País. Sem esquecer que a postergação do pagamento de parte dos Precatórios ainda trouxe insegurança jurídica. O governo, devedor, por decisão unilateral, definiu que não iria pagar parte das sentenças judiciais. Mas é preciso reconhecer que a PEC aprovada tira um peso enorme do quadro de indefinições, o que pode dar condições de o mercado buscar uma recuperação neste fechamento de ano.
Mas a agenda de problemas ainda está enorme e contaminando cada vez mais as expectativas para 2022. Teve a confirmação de recessão técnica, como citei, num momento em que o mercado já estava trabalhando com projeções muito modestas ou até negativas para o PIB de 2022. Mesmo com menos gargalos na indústria e retomada dos serviços, além da provável reação do agro, que, por algumas questões específicas, foi o que mais pesou para a retração do último trimestre, há enormes dificuldades para o País engatar uma expansão mais robusta. O poder de compra da população está em queda. A recuperação do emprego não produziu o esperado aumento da massa salarial, que está quase no mesmo nível do começo da pandemia, com o rendimento médio do trabalhador no pior patamar desde 2012. Efeito da inflação elevada e da piora da qualidade das novas vagas ofertadas. As condições do mercado de trabalho e da renda, combinados com a perspectiva de inflação ainda elevada, com juros em alta, já comprometem o fôlego do consumo e da atividade em 2022. Fora isso, há as incertezas fiscais e políticas em um ano de eleições, atrapalhando decisões e o fluxo de investimentos. A crise de energia ainda é uma incerteza, assim como a pandemia, especialmente com a nova variante ômicron.
Por mais que o Brasil esteja avançando, satisfatoriamente, com a vacinação, novas restrições já começam a ocorrer, sem esquecer da cautela da população, mais receosa quanto a uma nova onda. Serviços e comércio podem ter alguns segmentos mais prejudicados, como os ligados ao turismo ou que gerem maior aglomeração. E há os reflexos de medidas no exterior, onde a resistência à vacinação já estava gerando problemas.
O mercado continua tentando driblar o excesso de pedras no caminho, mesmo sem conseguir vislumbrar um cenário mais seguro. São poucas semanas pra fechar o ano, mas sem muitas chances da chamada virada de página. O próximo ano já promete grandes desafios. E, pensando em prazo um pouquinho mais curto, semana que vem tem Copom. Em meio a apostas mais convergentes, pelo menos para esta reunião, em que a Selic deve subir para 9,25%, fica a ansiedade quanto à indicação dos futuros passos do Banco Central. Afinal, o aumento da dosagem de elevação dos juros não conseguiu parar as revisões, para cima, das projeções de inflação, que já bateram no teto da meta do próximo ano, mesmo com as revisões, para baixo, das previsões para o PIB.
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