A divisão política americana pode gerar, daqui a três semanas, uma crise financeira internacional absolutamente evitável. Se o Senado americano não aprovar uma formalidade legal, o aumento do teto da dívida pública, o impacto sobre o mercado financeiro será devastador sobre todo o mundo, Brasil incluído.
Uma palavrinha de explicação. Nos Estados Unidos, orçamento público é assunto sério e popular. Sempre é bom lembrar que o país nasceu de uma questão fiscal. O que levou os moradores das 13 colônias a se separar da Inglaterra, no fim do Século XVIII, foi a tributação excessiva da metrópole.
Por isso, até hoje, “taxpayer money”, o famoso dinheiro dos contribuintes, é um tema politicamente relevante.
Há tempos que o governo americano vem gastando mais do que arrecada e a situação se agravou com o combate à pandemia. Isso vem provocando um crescimento acelerado da dívida pública, com autorização do Congresso. Há um teto para o endividamento (“debt ceiling”), assim como no Brasil há um teto de gastos, criado recentemente.
A Câmara dos Deputados, de maioria democrata, aprovou várias mudanças no dia 21 de setembro, autorizando a elevação do teto de dívida e pagar indenizações provocadas por desastres naturais.
Agora, a decisão está pendente no Senado, onde republicanos e democratas estão empatados. A intenção da oposição republicana é deixar com os democratas o ônus político de assinar uma autorização para o governo se endividar mais – apesar de todos os gastos já terem sido aprovados pelo próprio Congresso, neste governo ou em administrações anteriores.
Tecnicamente, o teto foi atingido no dia 1º de agosto. O Tesouro vem adotando medidas extraordinárias para ampliar esse limite, mas o próprio Tesouro avalia que, no dia 18 de outubro, não haverá mais dinheiro para pagar as despesas e os juros da dívida. E aí entramos na crise.
Sem um aumento do “debt ceiling”, o Tesouro ficaria em uma situação insustentável. Para honrar os juros dos títulos, ele teria de deixar de pagar o soldo dos militares e as pensões dos aposentados. Isso imediatamente abriria espaço para uma contestação legal, com advogados de aposentados questionando que eles não têm menos direitos do que os detentores de títulos públicos.
Por lei, o governo tem de pagar as despesas em dia, pagar os juros da dívida pública e respeitar o limite do endividamento.
Dada a situação, essas três condições – que, no limite, são conflitantes – podem levar o governo americano a deixar de pagar suas obrigações.
Se isso ocorrer, vai afetar os fundamentos do mercado. Por exemplo, os “treasuries”, que são os títulos federais americanos, considerados a aplicação mais segura do mundo, poderão ser considerados arriscados.
O governo americano tem a capacidade de tomar dinheiro emprestado pagando pouco porque oferece segurança e liquidez como contrapartidas.
Segundo o Brookings Institute, uma organização independente dedicada a analisar o governo americano, essa segurança permite reduzir os custos de captação do Tesouro em 25 pontos base (um quarto de ponto percentual) em relação aos demais países desenvolvidos.
Dado o nível atual da dívida, isso representa uma economia de US$ 60 bilhões em juros para o governo. O dinheiro economizado pode chegar a 700 bilhões na década.
A crise ultrapassaria as fronteiras dos Estados Unidos. O dólar é a moeda de reserva mundial e grande parte do sistema financeiro global se apoia no pressuposto de que os títulos do Tesouro são livres de risco. Se esse fato passasse a ser questionado, a crise resultante seria enorme.
Os consumidores americanos enfrentariam custos de empréstimos mais altos, tornando tudo o que compram com dívidas – casas, carros, qualquer coisa com cartão de crédito – mais caro, acabando com qualquer expectativa de recuperação econômica.
Os temores já vêm afetando os preços. Na terça-feira (28), as ações americanas e brasileiras caíram devido a uma alta da remuneração dos “treasuries” no mercado secundário. E enquanto não houver uma definição clara da elevação do teto de dívida, algo corriqueiro em tempos normais, os preços dos ativos ficarão sujeitos a uma volatilidade elevada.
Indicadores
O IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado) caiu 0,64% em setembro, após ter subido 0,66% em agosto. Com este resultado, o IGP-M acumula alta de 16,00% no ano e de 24,86% em 12 meses, informou a FGV (Fundação Getulio Vargas).
A principal causa da deflação foi a queda de 21,74% nas cotações do minério de ferro. Sem ela, o IGP-M teria subido 2,37% em agosto e 1,21% em setembro.
O IPA (Índice de Preços ao Produtor Amplo) caiu 1,21% após subir 0,66% em agosto. O IPC (Índice de Preços ao Consumidor) subiu 1,19% ante 0,75% em agosto. O INCC (Índice Nacional de Custo da Construção) subiu 0,56%, repetindo a taxa do mês anterior.
E Eu Com Isso?
Apesar da incerteza, os contratos futuros do Ibovespa e do índice americano S&P 500 iniciam o dia com uma leve alta, recuperando-se das perdas significativas registradas na véspera, apesar de haver uma volatilidade potencial elevada nos mercados.
As notícias são positivas para a Bolsa em um cenário de volatilidade.
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