A ata do FOMC divulgada na quarta-feira, uma das grandes expectativas da semana, reafirmou a intenção do Federal Reserve de manter a taxa de juros, nos Estados Unidos, estável entre 0 e 0,25%, ainda que a inflação esteja acima das expectativas.
Insiste no discurso de que a meta é de inflação média de 2% no longo prazo, o que dá condições de aceitar algo um pouco acima disso por algum tempo, apesar do risco de que suba mais que o esperado, principalmente, pelo descompasso na cadeia de produção. Uma novidade foi a observação de decisões, como do Banco Central do Canadá, que reduziu a compra de ativos, antecipando a elevação dos juros.
Além disso, o FED sinalizou que, talvez, já na próxima reunião, possa discutir a redução da compra de ativos. Seria um primeiro passo, antes de repensar a política de juros. O fato é que mesmo demonstrando estar atento às mudanças de cenário, quis passar o recado de não intenção de alterar os juros antes do previsto. De imediato, acalmou o mercado, mas logo a pressão voltou, com alta do dólar frente a outras moedas e dos juros dos treasuries.
No Brasil também temos visto a curva de juros pressionada pelo mercado, com muita frequência, para além da sinalização dada pelo Copom quanto ao ritmo de elevação da Selic. Pesa por aqui tanto o comportamento da inflação como as indicações vindas do mercado externo, essa possível mudanças na política do FED.
Independentemente das indicações dos Bancos Centrais, os mercados devem continuar tentando antecipar possíveis alterações nas perspectivas de ajustes dos juros. A alta dos preços de commodities é um alerta global para a inflação, somada aos efeitos da demanda mais aquecida, desequilíbrios da oferta e outros fatores mais específicos que podem fazer com que as pressões dos índices deixem de ser temporárias, exigindo maior aperto monetário.
A persistência do discurso do Federal Reserve na manutenção da atual política pode até ter algum reflexo sobre os movimentos do mercado, mas dificilmente vai reverter a expectativa de mudanças em prazo mais curto. Indicadores de atividade e inflação vão continuar sendo monitorados com muita atenção e divergências de leituras, como tem ocorrido desde a economia americana entrou em um ciclo de retomada mais vigorosa, sustentado pela forte aceleração da vacinação no País, além dos estímulos fiscais.
Já no Brasil, a inflação está ameaçando a meta. É quase certo que supere o teto neste ano, com projeções que já ultrapassam o ponto central no próximo. Ainda que seja uma inflação de custo, puxada, principalmente, por commodities, além de alguns preços administrados, pode ganhar força também do lado da demanda, caso se confirmem as projeções de uma retomada mais forte da atividade no segundo semestre.
Esse parece ser um ciclo muito provável, pelo esperado avanço da vacinação. Mesmo que estejamos convivendo com dificuldades maiores no trato da pandemia, que levaram até a uma CPI e atrasos no cronograma de vacinação, as indicações são de mais vacinas nos próximos meses.
A economia, que já tem mostrado dados acima das projeções, pode ter um desempenho bem mais favorável com a reabertura maior de atividade, permitido com a ampliação da vacinação e até mesmo antes disso, como se tem percebido pela queda dos índices de isolamento. Daí a expectativa de muitos analistas de uma elevação dos juros que ultrapasse a normalização parcial, como tem indicado o Copom.
Vale observar que, ainda que a inflação não seja de demanda, o atual processo de ajuste da Selic já colaborou muito para segurar o dólar, que também vinha sendo um forte componente das pressões de preços. Houve acomodação em meio às incertezas políticas e fiscais. Sem isso, a inflação poderia estar em patamar ainda mais alto. Isso demonstra que os juros estavam em patamar incompatível com o balanço de riscos. A correção em curso é adequada até para evitar que pressões adicionais coloquem a inflação em patamar ainda mais arriscado do ponto de vista da meta ou da convergência das projeções.
Enfim, há uma boa probabilidade de os mercados continuarem tentando antecipar movimentos dos juros diferentes das indicações das autoridades monetárias, com todas as implicações que isso possa ter sobre o fluxo de recursos e preços dos ativos. Sendo que a política de elevação dos juros, pelo Copom, acaba garantindo uma proteção adicional quanto aos reflexos desses movimentos. Pode segurar as pressões no câmbio sem atingir um patamar que comprometa o potencial da Bolsa que, vale observar, tem sido favorecida por essa alta das commodities, que traz tanta preocupação, assim como pela melhoria das projeções de expansão da atividade.
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