Chegamos à Super Quarta. Hoje, tanto o Banco Central do Brasil (BC) quanto o Federal Reserve (Fed), o BC americano, vão divulgar o resultado de suas reuniões periódicas para a definição da política monetária. Por aqui, o consenso é que a taxa Selic vai subir. O mais provável é um aumento dos atuais 2 por cento ao ano para 2,5 por cento, embora haja uma dispersão razoável nessas estimativas. O Comitê de Política Monetária (Copom) poderá ser mais incisivo e elevar os juros para 2,75 por cento, ou adotar uma abordagem mais suave e elevar os juros em apenas 0,25 ponto percentual. No entanto, qualquer que seja o resultado, a reunião desta quarta-feira será um divisor de águas. Pela primeira vez em seis anos o BC vai elevar a taxa Selic, que vem caindo desde 29 de julho de 2015, quando ocorreu a última elevação dos juros brasileiros.
Segundo a edição mais recente do Boletim Focus, a Selic esperada para dezembro deste ano é de 4,50 por cento, e a projeção para dezembro de 2022 é de 5,0 por cento. É razoável supor que os juros comecem a subir para conter a inflação e permaneçam subindo por um período mais longo, apesar de ser improvável que as taxas retornem aos 14,25 por cento ao ano de meados de 2015. E essa alta de juros vai representar uma mudança na política monetária dos últimos anos, que passou de apertada a frouxa, e de frouxa a “estimulativa” (para usar o jargão dos comentários e atas do Copom) de maneira a reduzir o custo da dívida pública e estimular a economia. O exagero no estímulo por muito tempo pressionou os preços e pode acabar com a ancoragem das expectativas.
Nos Estados Unidos há uma expectativa semelhante. Não há dúvidas no mercado de que o Fed deverá manter os juros americanos perto de zero e seguir com o processo de compra de títulos para irrigar a economia. Porém, os investidores vão usar as melhores lentes de aumento para pesquisar as declarações de Jerome Powell, presidente do Fed, e intuir se a autoridade monetária americana vai antecipar o início do aperto da política monetária. As expectativas oficiais são de que os juros e a liquidez nos Estados Unidos permaneçam como estão até 2024. No entanto, pode ser que a alta dos juros de longo prazo, em especial a dos títulos de dez anos do Tesouro americano, leve o Fed a antecipar esse aperto para, assim como no Brasil, manter ancoradas as expectativas de inflação.
Tudo isso deve provocar impactos profundos nos mercados acionários mundiais. A expressão “mudança de paradigma” foi tão usada que costuma provocar urticárias, mas aqui ela é pertinente. Desde a crise do subprime, os mercados mundiais convivem com juros zero ou negativos e liquidez não só abundante como também crescente. Ou seja, qualquer modelo de precificação teria de considerar um custo baixo de capital.
Esse cenário favorece as empresas em fase de crescimento que, como os bebês, são ávidos consumidores de nutrientes, em especial o capital. Por isso, os últimos anos foram a apoteose das “growth stocks”, nomes como Tesla e Uber, além das gigantes de tecnologia. Ações de empresas que se propunham a crescer aceleradamente, consumindo não apenas sua geração de caixa, mas também capital de terceiros.
Isso tem muita lógica e faz todo o sentido. Se o capital é barato e os empréstimos custam pouco, faz muito sentido crescer de maneira alavancada. Porém, a perpetuação dessas condições criou alguns “viciados em crescimento”, companhias que buscam uma expansão contínua e, muitas vezes, não param para fazer contas e saber se o negócio é rentável.
A desaceleração da expansão monetária e a redução das medidas de estímulo vai alterar esse cenário e mudar os termos da equação para as “growth stocks”. Agora, as “value stocks”, que andaram desprestigiadas nos últimos anos, devem voltar à cena com mais intensidade. Empresas com modelos de negócios sólidos e comprovados, que superaram crises e mantiveram-se funcionando devem voltar a ser protagonistas. Em resumo: é hora de pensar em reduzir a exposição em papéis de empresas de crescimento como Tesla e Uber e olhar com carinho para papéis menos “glamurosos”, mas mais sólidos, como Coca-Cola, Disney, JP Morgan e Berkshire Hathaway.
E Eu Com Isso?
A quarta-feira começa com os contratos futuros tanto do Ibovespa quanto do índice americano S&P 500 em baixa. A causa é a expectativa dos investidores com relação aos resultados da reunião do Copom e do Fed, por isso só haverá uma definição no fim do dia.