Após cinco sessões de altas consecutivas e valorização de 927,6 por cento no ano, as ações da rede varejista americana GameStop fecharam em queda de 44 por cento nesta quinta-feira (28). Nas negociações pós mercado, contudo, a ação indica uma alta de 90 por cento nesta sexta-feira (29).
É a ação mais discutida no mundo. Os papéis da GameStop e seus derivativos foram alvo de uma onda compradora nos últimos dias. O motivo não são os fundamentos da empresa, que segue em bancarrota. Longe disso. A causa é um plano orquestrado por participantes de um fórum de ações da internet dentro da rede social Reddit a fim de gerar um desconforto em fundos vendidos na ação, obrigando-os a zerarem (recomprar a quantidade descoberta) as suas posições rapidamente.
Esta necessidade de comprar rapidamente para manter a solvência eleva ainda mais o preço da ação. É o fenômeno chamado “short squeeze”. Acontece que a “brincadeira” foi longe demais. Fundos ficaram insolventes, quebraram e tiveram que ser resgatados. Com isso, o debate ultrapassou as fronteiras do mercado de capitais e adentrou nos campos regulatório, jurídico e até mesmo ético. A grande questão é se houve manipulação de mercado ou, no limite, algum crime financeiro.
E Eu Com Isso?
No curto prazo é difícil prever qual será a direção no preço das ações GME. Porém, estamos diante de um claro movimento especulativo, cujo descolamento entre preço e valor é sem precedentes na história recente dos mercados. O passado revela que essas histórias terminam mal para o “último otimista” que decide entrar no oba-oba.
A companhia em fundamentos:
A GameStop é uma varejista de vídeo games que oferece consoles, jogos, acessórios e itens colecionáveis do “mundo nerd”. Ela possui 5 mil lojas espalhadas em dez países, além de contar com uma estrutura (ainda incipiente) de e-commerce. O seu (limitado) diferencial consiste na possibilidade de seus clientes venderem produtos, podendo receber dinheiro ou trocá-los por créditos a serem utilizados na loja.
Seu modelo de negócio é, no mínimo, defasado e pouco rentável. Até mesmo em 2019 (pré Covid), a companhia já apresentava números ruins. Na comparação anual, a empresa apresentou uma queda nas receitas de 22 por cento, um prejuízo contábil de 471 milhões de dólares e um consumo de caixa total de 1,1 bilhão de dólares.
Em meio à pandemia, a companhia não conseguiu capturar os ventos favoráveis ao consumo dentro de casa/setor de games, e a situação operacional deteriorou-se.
Nos primeiros nove meses do último ano fiscal, nova derrocada: queda de 30,5 por cento na receita contra o mesmo período anterior e resultado operacional (Ebit) negativo.
Essa conjuntura criou um solo fértil para que investidores institucionais entrassem vendidos na ação, a fim de capturar ganhos com a desvalorização do ativo.
Porém, o call de venda “óbvio” e a ausência de instrumentos de regulação fez com que a quantidade de ações descobertas ultrapassasse a quantidade de ações em livre negociação da companhia, o que, em boa medida, corroborou com este fenômeno de grande magnitude.
“Better safe than sorry”. Embora nossa expectativa seja de que em algum momento i) a volatilidade das ações se reduza e ii) o preço retorne a patamares racionais, recomendamos não entrar em quaisquer uma das pontas nesta história. A regra número 1 de Buffett nos ensina a evitar perdas, e a regra número 2 nos ensina a seguir a primeira regra.